Nas últimas semanas, me tornei um especialista em Daniel Dantas. Já sei, por exemplo, que ele só come peixe grelhado com legumes cozidos e só usa gravatas azuis. Inacreditável! Um bilionário ao alcance do meu bolso!  Posso convidá-lo para jantar e ainda lhe dar um presente de aniversário atrasado. Sim, eu também já sei até o dia em que ele nasceu.

Descobri mais. Descobri, quase estarrecido, que Daniel Dantas não tem avião, iate, ilha, haras, fazenda, não tem carros, nem quadros — nada. Fiquei penalizado com a idéia de que o Daniel pudesse ser um bilionário pobre. Não ria, leitor! No Brasil, há centenas, talvez milhares, de milionários pobres que só sobrevivem graças à ajuda do governo. Mas bilionário pobre, Daniel seria o primeiro...

Mas felizmente não é o caso. Daniel tem,sim, um hobby caro como todo bilionário que se preze. Ele é colecionador. Um colecionador de pessoas. Se no futuro lhe sobrar tempo — e parece que há um bando de gente se esforçando para que lhe sobre muito tempo num futuro próximo — Daniel bem poderia escrever um livro que seria certamente best-seller: "Como ganhar dinheiro e colecionar pessoas".

Daniel começou colecionando economistas. Tomou gosto e logo passou a colecionar advogados. Depois foram juízes, ministros, políticos.  Ele também coleciona deputados e senadores, claro, Mas esses ele gosta mesmo é de mandar fazer — e os tem de todos os matizes.

Daniel acabou também colecionando inimigos, mas isso a gente tem de admitir que não é só ele, não. No Brasil, colecionar inimigos se tornou um hobby de qualquer homem público ou celebridade. Basta o sujeito ficar um pouquinho conhecido e ganhar uma graninha que logo começa a colecionar inimigos. O chato de colecionar inimigos é que é difícil se desfazer deles. Parece que os colecionadores se apegam muito a seus inimigos e não gostam de trocá-los por outros.

Mas a maior coleção do Daniel é a coleção de jornalistas. Ele chegou mesmo a ter a maior coleção de jornalistas do Brasil — quem sabe do mundo! Quando falo jornalistas não estou falando de qualquer jornalista, não! Ainda que Daniel incluísse peças menores em sua coleção, a maior parte era de jornalistas acima de qualquer suspeita. Um luxo!

A graça de colecionar jornalistas talvez esteja na variedade de tipos que é possível encontrar.  Advogados, por exemplo, são sempre sérios. Não existe advogado engraçadinho. Coisa mais chata... Entre jornalistas, há de tudo: os sérios e os engraçadinhos; os intelectuais e os popularescos; os jovens e os medalhões; os de direita, os de esquerda, os de centro. A lista é imensa — fora que essas características podem se combinar à vontade. Por exemplo, há o jovem engraçadinho de esquerda, o medalhão sério de centro e por aí vai...

Foi uma proeza e tanto Daniel reunir os melhores de cada tipo numa só coleção em exposição permanente anos a fio. Ainda não descobri por que, mas nos últimos tempos, ele teve de se desfazer da parte mais vistosa da coleção e hoje essas peças estão espalhadas por aí. Uma pena. O que sobrou ele mantém mais ou menos longe do público, talvez porque assim reduzida a coleção tenha agora um efeito meramente decorativo.

Seja como for, ninguém pode duvidar da contribuição de Daniel e sua coleção para o desenvolvimento das profissões liberais no Brasil. Sem alarde, o Bolsa-Dantas tem operado uma verdadeira redistribuição de renda contabilizada e não-contabilizada, numa espécie de programa social privado. E ainda que o presente tenha se mostrado ingrato, o futuro saberá lhe fazer justiça, Daniel. Pode ter certeza... Ah! E quando quiser comer um peixinho grelhado, está convidado.

 

 

julho, 2008
 
 
 
Antonio Caetano é carioca, cronista, tradutor e copy desk e vem existindo sem interrupções desde 1958. Mais detalhes no Café Impresso.