©dione veiga vieira

 
 
 

 

 

Daquela vez daria certo. Tinha que dar certo. Após sete tentativas frustradas, agora tinha a certeza de que encontrara a pessoa certa, a sua outra metade, o seu sonho e ideal.


Ela era perfeita! Tivera a mesma impressão das outras, mas descobrira tarde demais o seu erro.


Ela fazia tudo o que ele queria, sempre com o contentamento estampado no rosto, muito meiga, sorridente e carinhosa. Enfim, era sua alma gêmea.


Antes do casamento, se encarregara de arrumar a casa, mas não permitira a ela nem dar uma única olhadinha até quando estivessem casados. Queria que fosse surpresa.


Não teve muita dificuldade em ajeitar a decoração, pois já tinha tudo sonhado e projetado em sua mente. Exceto aquele vaso lindo que comprara à margem dos seus planos, pois simplesmente ficara encantado com a delicadeza de suas formas e a fina arte de seu acabamento externo ao deparar com ele na vitrine da loja. Sem dúvida, o mais lindo vaso de todos tinha que ser seu.


Não sabia onde colocar aquele lindo vaso, pois era um intruso em seus planos. Passou muitas horas tentando encaixá-lo no ambiente, mas sempre ficava insatisfeito com o resultado. Meticuloso e  perfeccionista, não suportava que alguma coisa estivesse fora do lugar, mas em todo lugar da casa aquele vaso parecia um intruso. Sua estonteante beleza o deixava em desarmonia com o ambiente. Finalmente encontrou um lugar para o vaso, um lugar isolado onde ele poderia reinar, soberano e senhor de uma nação despovoada. Assim, ficou tudo simplesmente perfeito.


O casamento correu conforme o planejado. Maravilhoso como sempre sonhara.


A primeira noite foi uma noite de sonhos, como aquelas dos romances mais açucarados.

Amanheceu um dia radiante após a inebriante noite. Saiu para comprar jornal e os ingredientes para um delicioso café da manhã.


Quando retornou supreendeu-se ao encontrar o vaso, seu tão querido vaso, como um irritante intruso, fora do lugar a ele destinado.


Perguntou para a esposa quem tirara o vaso do lugar. Ela respondeu que resolvera mudar o vaso de lugar, pois estava deslocado do ambiente assim tão sozinho. E, permanecendo onde estava antes, ele ficava parecendo um patinho feio.


Percebendo que errara na escolha mais uma vez, seu coração acelerou, o sangue estufou suas veias e rapidamente insuflou seus neurônios do mais inclemente e impiedoso ódio.


Pegou o vaso e o despedaçou na cabeça de sua mulher, espalhando sangue e miolos por todos os lados.


Limpou meticulosamente toda aquela sujeira e arrastou o corpo sem vida até o porão. Deslocou a laje que fazia as vezes de parede falsa no fundo do salão. Um odor nauseabundo invadiu suas narinas, porém, já acostumado, desta vez não vomitou. Jogou o corpo na pilha onde estavam os outros sete corpos e assim terminou o seu oitavo casamento.

 

 

 

 

 

outubro, 2009
 

 

 

 

Benno Assmann (Natal-RN, 1959). Engenheiro, Doutor em Ciências pela UFRG e Mestre em Engenharia pela UNICAMP, venceu o concurso Prata da Casa/2009, na categoria Contos, da Petrobrás, com o conto O Oitavo Casamento. Escreve o blogue As Noites Insones em Claro.