VIAGENS DO CORAÇÃO

 

Quando as palavras não dizem

o amor conta

e são tantos os casos

que este coração debruça

sobre o seu e pergunta

onde o amor?

 

Por que tanta neblina,

nuvens, soluções

e o amor é mel que se bebe no

corpo do outro e

outra é a sua face

e urgente é

seu apelo e fome?

 

Por que se evita, evadir-se,

viajar

adiar o coração

se amor é porto

de nunca chega?

É leitura de olhos

escrita ifrada

trançar de dedos

mãos.

 

 

 

 

 

 

CANTIGA DE AMOR

 

O amor sei que é travo senhora,

mas cavaleira sou e te

consagro amada amante de

teus olhos sigo errante

por estes mares e por mares

Nunca dantes

 

Navegados teus olhos parto

e me reparto em lutas mil

contra gigantes, moinhos, ventos

mas me torno lento, senhora

quando teu corpo se esquiva

e me torno um barco à deriva.

 

Amor, sei que é travo senhora,

mas cavaleiro dou e te sagro

amante cortesmente me detenho

diante de teu corpo de teu

semblante e colho de tua pele

a flor rara deste amor errante

 

 

 

 

 

 

A COR DA LIBERDADE

 

Deixar na pele o sol da servidão

é possível

Deixar no corpo o frio as solidão

é possível

Deixar nos olhos as paisagens do exílio

é possível

 

É possível apagar o banzo que é sinete no

coração

Trocar de nome, idioma, país,

é possível.

 

Até achar que a lua do Senegal

tem a mesma claridade do luar

que penetra sorrateiro e clandestino

nos porões da senzala.

 

Tudo é possível

 

Impossível é calar no homem

o vento da liberdade.

 

 

 

 

MORADIA

 

A arte não tem dono

o artista não tem pouso

o lugar do artista

é onde mora o mundo.

 

 

 

 

 

 

A CASA DO SOL DO GIRASSOL

 

O Sol do girassol

é vermelho, é amarelo

azul e verde.

É branco, cinza

violeta, lilás.

Aliás o Sol do girassol

é planta é flor

que mora na caixa de lápis

de cor.

 

 

 

 

 

 

O PAPAGAIO

 

O papagaio brinca no céu

com o desenho de nossos

olhos.

Em seu vôo,

cores ganham plumagens

e o coração, asas.

 

 

 

 

 

 

IL GATTO BLU

 

O Gato

trajando um pijama

yellow blue

 

ronrrronrronaaaaaaaaaaaaaa

na cama da madama

as possibilidades de ter também

uma gata azul

nos telhados do Nirvana.

 

 

 
(imagem ©bigbed)

  

  

 

Ronald Claver (Belo Horizonte/MG). Lecionou no Colégio Técnico da UFMG até se aposentar. Como escritor recebeu os prêmios Nestlé e Cidade de Belo Horizonte. O próprio poeta escreve a sua biografia, misturando vida e poesia: "Sou mineiro e estou perdido em Belo Horizonte desde que me deram o mundo de presente. Nasci em setembro, sou virgem. Embora a virgindade tenha-se perdido nestas montanhas de utopias e abismos. Nasci no dia da Independência, mas continuo dependente da vida, das manhãs, dos ermos e da poesia. Fiz um quase nada de tudo, inclusive vender pipocas em circo de tourada. Minha grande decepção é ter passado por debaixo da lona e ser convidado a sair justamente quando o leão comia o domador. E nesta antropofagia que é o mundo e para não ser devorado, me armei de poesia e prosa e hoje resisto e canto apesar dos fuzis e dos homens. A literatura é uma companheira legal e fiel. Conhecia-a ainda menino, sem a carteirinha de escritor e sem pedir licença fui escrevendo o mundo. A matéria do escritor é a vida e esta explode nas esquinas, nos bares, na sala de jantar, nos becos, estádios e corações. A vida é eletricidade. O escritor é o fio condutor desta realidade. E dá choque. Já fiz teatro, audiovisuais, fui diretor de colégio, Secretário Municipal de Esportes. Já ganhei prêmios literários. Tenho mais de 20 livros publicados. Alguns esperando o selo das editoras, outros na gaveta da cabeça. Pai, mãe, 6 irmãs e um irmão nasceram em Mesquita, cidadezinha que parou no tempo e no mapa de Minas, ainda bem. A caçula e eu nascemos na capital e nem por isso somos capitalistas. Miriam, Pablo, Mariana e Thiago ajudam-me a sedimentar e plantar a paixão, a poesia e o pão nosso de cada dia. São Francisco é meu santo, meu irmãozinho, meu rio, minha sandália e minha lua cheia de fé e sol. Confesso que há essa contingência que chamamos amor. Que às vezes é fel, às vezes é flor". Autor, dentre outros, de Palavras do poeta (Ilustração de Jussara Brasil. Belo Horizonte: OAP/UFMG, 2002) e Hoje tem poesia (Ilustração de Angelo Abu. Belo Horizonte: Editora Dimensão, 2005). Seu site oficial: www.ronaldclaver.com