Péricles Prade irrompe a alteridade permanente e projecta a cosmovisão dramática das palavras metapoeticamente, com a sonoridade-alógrafa do figural zoomórfico.

Os limites da esfericidade de Péricles regressam à heterogeneidade descomunal, ao paroxismo do labirinto, aos fragmentos da origem, às perspectivas da ruína reconstruindo as energias dos instantes originários como uma profundidade-de-mistérios de um ecossistema central onde a pulsação migratória, a perspectiva-secreta do poema é incandescente e reveladora da imagem-primordial-Jungeana. Esta explosão da espiral prismática revive o insondável-do-manancial-materno como instâncias-vocais no fundo imperceptível (aberto aos tumultos) do poema (Péricles potencializa um corpo-movimento-hierático sincronizado as multiperceptividades  e as sensações-intersticiais dos chakras-(nadis-prana) com a complexa dialéctica de Hermes Trimegistus).

A transpoesia de Péricles Prade reinaugura o elementarismo da autonomia afectiva, da  interrogação/metafísica onde o corpo-reflexivo se auto-(re)constrói. As espessuras das palavras são descentramentos do silêncio que alcançam a cosmicidade mais intima num movimento de exigências ígneas e esotéricas.

Péricles Prade abre-se às ressonâncias da IMPOSSIBILIDADE e a sua metamorfose restitui a liberdade selvagem como uma génese-iminente entre a dilaceração da linguagem, as fendas do deserto, as condensações heurísticas, a celebração do desconhecido e o renascimento da consciência.

As vibrações imprevisíveis e indefiníveis atingem a insurreição dos espelhos da existência: espelhos infabuladores-sacro-eróticos, mitológicos, esotéricos-astrológicos, fantasmagóricos num ritual-de-gestações-voltaicas-verbais onde a coexistência da luminosidade e da escuridão sincronizam os impulsos das travessias para uma consistência-outra, construindo as veemências do ilimitado, a exaltação da transpessoalidade, a aspiração do não lugar-da-LENGUAGE: eis a teia-pulsional a eclodir na nossa incompletude:  fortíssima heterogeneidade da "luz no sangue" como uma ebulição petrológica no princípio da incerteza de HEINSERBERG e a tenuidade/circularidade da existência humana (do INFIGURÁVEL).

As correspondências com a respiração do desconhecido, do intermezzo das osmoses dos sons-das-sílabas tornam indomáveis as palavras do desejo-inconsciente (e da espontaneidade) de Péricles Prade como uma nova representatividade "do ouro na veia fatal" que nos faz ver por dentro (ver o perceptível do oculto). Este encadeamento magnético recupera o esplendor "de verbalizar o indizível" e integra o desassombro na materialidade epistemológica que reactualiza a irrupção interrogativa-metafórica da linguagem.

O fogo em desabrochamento cosmoficador-erotizador navega no próprio corpo do poema e do poeta como uma desmesura permanente elevando as germinações dos entrecruzamentos simbólicos-oscilantes-antropomorfizadores.

A  defrontação-impetuosidade dos seus poemas formam um corpo ardente numa incubação enigmática onde a intensidade sígnica participa na antiquíssima ruptura-do-ser  formando outras imagens-nómadas infra o deserto que revela o informulável, a musicalidade, a metamorfose da matéria poética.

A fusão-alquímica vai de encontro à impulsividade da raiz da vida e radicaliza o poeta PÉRICLES PRADE nos habitats cósmicos, onde as palavras convertem as vozes, os gritos, as correspondências no silencio da matéria primitiva (o grito do poema  singra no não-lugar e implode noutro grito de energias instauradoras de prolongamentos de horizontes-alegóricos)

Na espessura das imersões dos poemas Périclianos, as palavras desencadeiam-se na cristalização do "clinamen da retornança", na opacidade, na invisibilidade buscando o verdadeiro lugar, a elementaridade original: a performatividade incandescente do poema, perscruta PAR EXCELLENCE os mistérios e as imagens monádicas do deserto. É nesta correnteza que Péricles Prade propicia a cadência re-inaugural da substancia verbal.

Perícles Prade unifica as linhas mutantes do poema como uma pintura-escrita cheia de imanências e multiplicidades pagãs-profanas como um templo de fábulas, abrindo as cadências fenomenológicas do panteísmo, transmigrando palimpsesticamente com Mircea Eliade "dizer um mito é proclamar o que se passou ab origin". Péricles reconcilia nas suas construções poéticas uma espécie de  fusionismo-caleidoscópico-antropológico de Bronislaw Kasper Malinowski e Radcliffe-Brow. Ele avança para a presença intensa da operação mágica, da catástrofe, da instabilidade onde as dissemelhanças resgatam os limites-dos-limites da vida (um jogo-palavra do poema que arranca a parábola da encarceração porque o relâmpago do poema fala-de-si-mesmo entre a substancia-abismal do mundo).

A lancinante errância da palavra de Péricles Prade desperta a iminência da integridade absoluta entre os naufrágios da linguagem onde o enigma é irresistível como a imperscrutabilidade-da-volatilização-do-corpo. Estas transmigrações libertadoras do enigma constituem os simulacros ontológicos do poeta na EPISTEME do vórtice penetrando nas incertezas, na vacuidade, na aventura onde o atraimento do mundo é uma linguagem de descicatrização-de-vertigens.

Péricles Prade (de)sintegra o poema da vida absoluta com a correnteza relampagueante , cósmica da palavra dos povos da antiguidade clássica. A palavra a revelar os territórios dos expatriados de Florença com a visão-outra. A face da adivinatória de Péricles antecipa-nos para o alvoroço do transcendentalismo e para o sublime do desejo do auto-conhecimento como os interstícios hipnóticos das coordenadas a absorverem os impactos das moradas, os golpes das luzes crepusculares (linhas de vida a reconstruírem epifanias nómadas, irreverências, transitividades)

O "AUDE SAPERE" das palavras de Péricles explora a desocultação corporal numa IMAGEM polissémica-emigradora que nos liga à revivificação da vulnerabilidade que galopa como uma tapeçaria de gritos entre os homens e a transmutação em potencia.

A incandescência de "SACRARE" de Périples absorve os estremecimentos dos engenhos estranhos, a transcendência do mundo, as infabulações- neo-paganistas como uma dramatização subvertedora a recriar emboscadas arquitectónicas nos sentidos-mitógrafos.

Os vocábulos de Péricles buscam as plasticidades das intermitências, as desfocagens da profundeza placentária, as fronteiras sacralizadoras dos silabários. Assim os poemas de Péricles perfuram os enraizamentos meteóricos absorvendo a experiencia da heterogeneidade e os ecos demiúrgicos. Estas membranas genuínas dos poemas centralizam-se nas musicalidades antropofágicas-feiticeiras como vozes concatenadas num curto-circuito e tudo se (de)compõe na transferência respiratória da GÉOGRAPHIE  UNIVERSELLE das escrituras.

 

 
 
setembro, 2010
 
 
 
 

 

Luís Serguilha (Vila Nova de Famalicão, Portugal). Coordenador de uma Academia de Motricidade-Humana. Poeta e ensaísta, suas obras são: O périplo do cacho (1998), O outro (1999), Lorosa'e boca de sândalo (2001), O externo tatuado da visão (2002), O murmúrio livre do pássaro (2003), Embarcações (2004), A singradura do capinador (2005), Hangares do vendaval (2007), As processionárias (2008), Roberto Piva e Francisco dos Santos: na sacralidade do deserto, na autofagia idiomática-pictórica, no êxtase místico e na violenta condição humana (2008), Korso (2010), os dois últimos em edições brasileiras. Seu livro de prosa intitula-se Entre nós, de 2000, ano em que recebeu o Prémio de Literatura Poeta Júlio Brandão. Participou de vários encontros internacionais de literatura e possui textos publicados em diversas revistas de literatura no Brasil, Espanha e em Portugal, além de outros trabalhos traduzidos em língua espanhola, inglesa, francesa, italiana,alemã e catalão. Responsável por uma coleção de poesia contemporânea brasileira na Editora Cosmorama.

 

Mais Luís Serguilha em Germina

> Poemas