Moacy Cirne, De olho no olho do olho de Nina Rizzi. Versão digital, Poema/Processo, 2010.
 
 
 
 
 
 
 
 
 

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Reflexões a partir da leitura de Poema/Processo: A prática Experimental como Saber Militante.

In: CIRNE, Moacy. Luzes, Sombras e Magias — Os filmes que fazem a história do cinema. Natal: Sebo Vermelho, 2005.

 

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"É preciso politizar a arte"

"É preciso politizar a vanguarda"

"É preciso espantar pela radicalidade"
- Máximas do Poema/Processo.

 

Embora as finalidades artísticas do artista primitivo, do da Renascença, e deste "pós-moderno" sejam diversas, o efeito artístico, sob quaisquer condições, constitui uma situação que serve para elevar a percepção. Poder-se-ia considerar que todas as artes agem contra o meio e as tendências. Absolutamente qualquer forma de ambiente satura a percepção de modo que sua própria marca seja imperceptível. Possui o poder de distorcer ou desviar a percepção humana. Mesmo as artes mais populares, podem servir para aumentar o nível da percepção, ao menos até se tornarem totalmente ambientais e despercebidas.

 

Uma poesia, um filme, uma pintura, uma música, a arte enfim, é em todos os sentidos uma máquina de ensino para o exercício da percepção e do discernimento. O artista é uma pessoa especialmente ciente do desafio e dos perigos dos novos ambientes — tecnológicos — apresentados à sensibilidade humana. Onde a pessoa comum busca segurança entorpecendo suas percepções diante do impacto da nova experiência, o artista usufrui desta novidade e instintivamente, ou não, cria situações que tanto a revelam quanto a tornam compensadora. O artista estuda a distorção da vida sensorial produzida pelo novo programa ambiental e tende a criar situações artísticas que corrigem as inclinações sensoriais e o desarranjo gerados pela nova forma — artificial.

 

Em termos sociais, o artista pode ser considerado o piloto que sabe lidar com a bússola apesar do desvio magnético da agulha provocado pelo volúvel jogo das forças. Assim concebido, o artista não é apenas um bufarinheiro de ideais ou experiências sublimes. É, antes, o auxiliar indispensável para a ação e a reflexão. 

 

Alváro Sá, Poemics, 1991.

met4pl4g!o não: possesse-se de pra dadá pra cá, dadá pra lá 
nina rizzi

 

leia nina rizzi como se estivesse

ouvindo naná vasconcelos.

 

assista carne trêmula

como se nina rizzi te ensaboasse.

 

recite nina rizzi como se estivesse

comendo salsinha, castanha ou chocolates.

 

ouça as suítes pra violoncelo de bach como se estivesse

comendo nina rizzi. 

coma nina rizzi
como a fazer poemas impossíveis.

 

 

 

DA POESIA VERBAL AO POEMA/PROCESSO

Moacy Cirne, I Poemas Inaugurais, Sebo Vermelho, 2007.

 

[...]

4.

Mas o poema/processo, desde o início, abriu espaço para as vertentes semânticas. Daí o conceito de projeto. A própria matriz passava a ser um projeto, capaz de gerar novos poemas, sejam eles as séries gráficas, sejam eles os projetos semântico-verbais. Que poderiam se transformar em poemas/ projetos cinéticos, ambientais, tipográficos, comestíveis, sonoros. E assim por diante. E aqui estamos diante de uma diferença radical em relação à poesia concreta, por exemplo: toda poesia concreta é acabada, "fechada", monolítica; já o poema/processo, para ser de fato um poema/processo, implica trans/formações.

 

5.

Ou seja, implica trans/formações internas e externas. Não existe um poema/ processo definitivo, pronto, "acabado", a não ser como registro documental, daí a importância do leitor e da leitura: o leitor e a leitura que fazem da poesia (sentimento) o espaço possível par o poema (concreção) [...].

 

11.

Assim são nossos Poemas inaugurais. Nem melhores, nem piores. Simplesmente poemas — poemas que se pretendem poemas/processo. E que, se aceitam e se entusiasmam com a boa poesia clássica e/ ou moderna, rejeitam a má poesia, seja conservadora, seja modernosa, seja engenhosa, seja lírico-verborrágica. Afinal, aqui e agora, hoje e sempre, competência, invenção e sensibilidade podem fazer a diferença. Em Poesia e Arte. E no Poema. E se não é possível transformar o mundo através de suas propostas, que, então, elas nos levem aos caminhos e às veredas do saber poético-literário. E ao saber militante.

 


Versão do Balaio, 2008, para Poemics de Álvaro Sá, em Poema/Processo, 1997


 

POEMAAAAAAAAAAAAA 

"o poema/processo é um poema possesso" 
(Poeta baiano, Salvador, 1968) 

Versão 2007: 

POEMA/PROCESSO OU POEMA/POSSESSO 
IMPORTANTE É SER POEMA/POEMA PROTESTO 

Versão 2010, Nina Rizzi 

Que seja o poema/ processo 
uma possessão de prétextos 
............................ pós tudos, 
pela posse de nada'lém 
que os séc'los de protestos 
.................. dos despossuídos. 

Projeto inaugural: 1972 
in Revista de Cultura Vozes (Petrópolis) 

Versão 2007: 

Romance do pavão misterioso 
ou 
Um crepúsculo é um crepúsculo é crepúsculo 
é uma aurora sapeca nas terras em transe de 
São Saruê 
ou 
De Caicó a Jardim, Acari e Currais Novos 
o Seridó é um só, sol e lua, lua e água, 
água e sertão, sertão e Seridó. 

Versão 2010, Nina Rizzi 

'inda que corpo 
foderosa fortaldeleuzabelabela, 
sempre sê 
— São Saruê. 

 

ANTIPROJETO nº 4 

Projeto inaugural: 1979, 
in Objetos verbais (Rio) 

1. construa o seu poema. 
2. que seja radical. 

Versão 2007: 

1. construa seu poema. 
2. que seja experimental. 

Versão 2010, Nina Rizzi 

1. construria seu poema: 
neanderthal, marginal. 
2. mas que não seja pagapau 
metido a maioral. 

 

ANTIPROJETO nº 6 

Projeto inaugural: 1979, 
in Objetos verbais (Rio) 

1. 
2. 
3. 
4. 
5. 
6. 
7. faça uma salada tropical com as 120 mil palavras do aurelião. 
8. junte à salada uma garrafa de murim e um livro de Zola. 
9. sirva o poema bem gelado. 

Versão 2007: 

1. Projete um poema com os melhores versos 
de Jorge Fernandes, José Bezerra Gomes, 
Zila Mamede, Nei Leandro de Castro, 
Sanderson Negreiros, Luís Carlos Guimarães. 

2. E mais os versos de Miguel Cirilo, Marize 
Castro, Carmen Vasconcelos, Iracema 
Macedo, Ana de Santana, Iara Maria 
Carvalho, Wesley J. Gama, Theo G. Alves e 
Jeanne Araújo. 

3. Em tardes seridolentes, o poema será 
bordado cm as cores azuiz da Barraca do 
Encarnado. Sob a supervisão das 
bordadeiras de Caicó, em plena Festa de 
Sant'ana. 

4. Depois, sirva o poema bem gelado, 
acompanhado de uma garrafa de Samanaú, e 
de uma cesta de caju amigo. Ao lado, um 
disco de Carlos Zens, para ser ouvido & 
ouvido. 

Versão 2010, Nina Rizzi 

1. esculpa um poema 
com seus dedos. 

2. pinte com sua língua 
o poema de pernas BEM 
abertas )( 

3. sirva podevirquentequ'eutôfervilhando 
na buceta da amanteamada 
ou no pau do amadoamante, 
ouvindo dindi aos gemidos. 


ANTIPROJETO nº 10 

Projeto inaugural: 1979, 
in Objetos verbais (Rio) 

releia este poema com a máxima atenção 

Versão 2007: 

não sim não 
releia este poema 
sim não sim 

Versão 2010, Nina Rizzi 

pelo vinho e pelo pão 
role com esse poema no chão 
e o coma em peloscabelos 
 

ANTIPROJETO nº 12 

Projeto inaugural: 1979, 
in Objetos verbais (Rio) 

1. talvez sim. 
2. talvez ficção. 

Versão 2007: 

1. talvez sim. 
2. talvez fricção. 

Versão 2010, Nina Rizzi 

1. provavelmente sim 
2. provável mente a verdade. 

 
ISTO NÃO É POEMA/ PROCESSO 

A PRAÇA 
(in Cinema Pax, Rio/Natal) 

joão da paraíba oferece a alguém, 
com 
muito 
amor 
e carinho 
lábios que beijei, na voz de orlando silva. 

SIM, ISTO É UM POEMA/ PROCESSO 

Poema Inaugural: 1983 

Versão 2007. 

1ª Versão 2010, Nina Rizzi 

Poema Inaugural 1983: 
foi há vintesete poéticos ânus. 

2ª Versão 2010, Nina Rizzi 

nina rizzi, peladapeladinha 
bem temperadinha, 
oferece seu corpoema a ser pintalinguado. 
 

POESIAPOEMVPOESIA 

POEME-SE! 
(J. Cardias, Rio, anos 80

Versão 2007 

poeme-se de vermelhância 
poeme-se de azuluminosidade 
poeme-se de ventania 
poeme-se de trovoada 
poeme-se de natalpotengi 
poeme-se de sertãocaicó 
poeme-se de garapinhada 
poeme-se de poesia 
e, de poema em poema, 
poeme-se de amorpaixão 
mangamangaba e cinepax 
gonzagão e bachelardência 

Versão 2010, Nina Rizzi 

moacyanime-se de cinema 
ninarizzi-se de línguas 
poeme-se de tudos 
 

POEMA/ PROCESSO 1986 

Projeto inaugural: 1986 
Versão 2000: 

ESTE POEMA é merda pura. Não, este poema não 
é merda pura. 
Este poema é um soco no saco dos sacanas da 
Sibéria. 
Não, este poema não é um soco no saco dos 
sacanas da Sibéria. 
Este poema é um convite para uma viagem a 
Marte e São Saruê. 
Este poema é um grito contra os agiotas da grafia 
palavrosa. 
Não, este poema não é um grito contra os agiotas 
da grafia palavrosa. 
Este poema é um bangalafumenga qualquer 
qualquer qualquer. 
Não, este poema não é um bangalafumenga 
qualquer qualquer qualquer. 
Este poema é um sim, é um não, é um talvez. 
Não, este poema não é um sim, não é um não, não 
é um talvez. 
Este poema é um dedo, um dado, um dia do 
folheto de cordel. 
Não, este poema não é um dia, um dado, um dedo 
de folheto de cordel. 
Este poema é uma boa bosta. 
Sim, sim, sim! 
Este poema é uma boa bosta; de preferência, com 
farinha. 

Versão 2010, Nina Rizzi 

me'rmão, esse poema né porca 
bosta, não: 

é muita bosta mole com limão 
pimenta e areia, 

bem nos zóim do cu 
enfiado por meus dedos 
trifálicos. 

 
POEMV 321 

Projeto inaugural: 2007, 
in Balaio Porreta 1986 (Rio/Natal) 

três poemas de josé bezerra gomes incomodam 
muita gente 
dois poemas concretos incomodam muito mais 
dois poemas concretos incomodam incomodam 
muita gente 
um poema/processo incomoda muito mais 
muito mais 
muito mais 

Versão 2010, Nina Rizzi 

um poema/processo incomoda 
muitamuitamuita gente besta 

uma nina rizzi de pinguelo molhado e inchado 
incomodaincomodaincomodaincomodaincomodaincomodaincomodaincomoda 
muitas 
muitas 
muitas 
mais 
bem-casadas de cabelos em pé 
e pentelhos costurados. 

* 

OBRAS DO AUTOR 

Os lusíadas 
A divina Comédia 
A biblioteca de Babel 
A biblioteca de Caicó 
Viagem a São Saruê 
Viagem ao Poço de Santana 
Para ler Marx e o Capital 
Para ler os quadrinhos 
A invenção de Orfeu 
A invenção de Caicó 
A poética do devaneio 
A poética das águas 
Seridó, sedução e solidão 
Quadrinhos, sedução e paixão 

Versão 2010, Nina Rizzi 

O autor esqueceu de acressentar: 

Para ler o corpoema de Nina Rizzi em braille 
Como comer Nina Rizzi sem sair do lugar 
A invenção de Nina Rizzi 

Segunda Versão 2010, Nina Rizzi 

OBRAS DA AUTORA 

Moacy Cirne 

 

PENÚLTIMO POEMA

 

ÚLTIMO POEMA,

ANTES

DO

PENÚLTIMO,

DEPOIS

DE

CAICÓ

 

Versão 2010, Nina Rizzi

 

último poema urgente

antes do primeiro

depois de

trepar

com chico doido

in caicó


auroraenlouquecida em madrugância de saudade 
nina rizzi 

eu queria divulgar o projeto semântico inaugural 
de março de 2005 
"CORRENTEZA EM NOITE DE LUA VERMELHA". 

mas não vai dar, não vai dar 
que eu não posso porque não quero 
que agora quero 
voltar a são saruê.

 

Saul Steinberg (romeno naturalizado estadunidense, 1914-1999). Techniques at a Party/Técnicas em uma festa, 1953. Tinta, lápis de cor e aquarela sobre papel 58,4 x 36,8 cm. Saul Steinberg Foundation, Nova York.

 

Steinberg foi um cartunista famoso por suas ilustrações para o 'The New Yorker' magazine:

 

- uma elegante e engenhosa invasão do banal como forma especial de ironia;

 

- três variedades de espaço aparecem concomitantemente: o renascentista, o comercial-gráfico e o simples;

 

- com virtuosidade de diretor, Steinberg, como Falves Silva, orquestra espaços. 

 

 

 

maio, 2012
 
 
 
Nina Rizzi (São Paulo, 1983). Escritora, historiadora e arte-educadora. Tem textos e poemas publicados em antologias, nas revistas VacaTussa e La Papa Ruchada (Argentina) e em várias páginas da internet, entre elas, Zunái — Revista de Poesia & Debates, Garganta da Serpente e Balaio Porreta. Faz parte de Dedo de moça, uma antologia das escritoras suicidas (São Paulo: Terracota, 2009). Publicou tambores pra n'zinga (Rio de Janeiro, Multifoco, 2012). Edita os blogues Ellenismos e Quandos, e escreve no Putas Resolutas. É uma das Escritoras Suicidas. Vive em Fortaleza/CE.
 
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