ASFIXIAS...

 

 

A carne que sangra & treme

na hora do Levante ou do Amor

& arrepia a coluna vertebral do Mistério

as Odes cuspidas pelos pássaros

diretamente aos nossos ouvidos

Sinta o ar ARDER na tarde

Sinta meu membro pulsando dentro de você

Sinta meus olhos dilatados com a erva

ou minha respiração musical ressoar

de minha caixa toráxica que possui gritos no peito

Essa carne que ama & que vence o medo

& atinge uma episcopal inocência

Límpida como a língua da cobra que aliciou Eva

exalar como ondas de calor

em cada núcleo atômico & bombástico do Ser

Sinta... apenas isso...

SINTA...

 

 

 

 

 

 

BACH RASGAVA MINHAS VEIAS...

 

 

Bach rasgava minhas veias

enquanto eu esperava uma inacessível

chuva de meteoros

intoxicar minhas retinas pútridas

em meio à baderna cinza das nuvens

estive deitado na caixa d'água

em cima do vigésimo andar do sonambulismo provinciano

esperando o anúncio dos jornais

ou algum sinal divino

que colidisse contra a minha vida em inércia

 

eu sonhava com tal despedida do ócio

enquanto dedilhava em minha braguilha as lembranças

& as mortes

& mal sabia que tinha caído em queda livre de novo

em alguma teia ou magma convulsivo

lá fora os totens seriam beijados pelas massas

as palavras do Papa seriam aceitas

os autores best-sellers venderiam suas porcarias

os pastores assumiriam as posições políticas

as crianças chorariam as misérias

& eu estava quase imune lá no alto

como uma pretensa formiga superior

com o peito em chamas

degradado em todos os meus esforços

um rosto que seria colado num cartaz comido pelo vento

que os manicômios & prisões gostariam de acolher

mas, por sorte,

sou esperto o suficiente pra não parar lá

ainda

que essa chuva não caia

as notas de Bach são cascatas & mísseis que me eletrizam

me estupram

me assaltam

no estertor noturno

na gratuidade da vida

& sua espera.

 

 

 

 

 

 

(C)EGO

 

 

Havia flores no glaucoma

& minhas desafinações eram tão potentes

que faziam vitrines explodir em rios

de seda

Havia talhos nas árvores

que fariam corar as velhinhas nas praças

Havia trilhos beijados por pés descalços

enquanto na lembrança da borboleta havia

o sufoco da crisálida

Havia horizontes

escondidos dentro daquela obsessão

Havia esperança

para aqueles que só defecam maldade

Havia sol

por trás da cortina de fumaça do sonho

& você o renegou

pela ilusão que cultivou

em seu espelho

 

 

 

 

 

 

CANTO DE GUERRA

 

 

Vozes despidas inundam as ruas

fruto dos ouvidos saturados de Mentiras

& dos olhos fatigados da

Alegria que Ninguém vê

Não está nas novelas

nas revistas

nas notícias

a incólume FELICIDADE

que nasce

do ato de reivindicar

& TOMAR PARA SI

a LIBERDADE (essa Dama Selvagem!)

 

Seus Fantoches

— sustentados pelos Artifícios Mirabolantes

da Idiotização em Massa —

estão roucos

& atirando nos próprios pés

Seus sentinelas

continuam a LADRAR

suas Bombas Vencidas

& sua Monstruosa Ignorância

— teremos que reensinar o Alfabeto

aos Leigos do AMOR FUTURO

exclusivo da Profana Experimentação —

Deitaremos nas Ruas

copulando entre cacetetes & balas de Borracha

a polifonia desmedida

da Nação Sem Fronteiras

As destemidas Crianças

— vândalos amorfos com sua Libido-Kamikaze —

expremem agora de seus corpos galvanizados

esse vulcão

liberando CATARSE & PURIFICAÇÃO

(contra toda Frustração das Velhas gerações)

da ferida da Alma

onde estavam morrendo asfixiados

seus Desejos & Esperanças

 

Suas vitrines EXPLODIRÃO

suas Viaturas QUEIMARÃO

sob a Tempestade de Nossa REVOLTA

Nossos braços

derrubarão

os Símbolos Mortos

da Pré-História Corrupta

& seus alicerces "Morais",

"Tradicionais"

& todo esse BLABLABLÁ RISÍVEL

Presidentas (Presidentes também, claro!)

serão VAIADOS

& sua corja simiesca

de Intérpretes serão CALADOS

pela nudez dos Fatos

 

Avançaremos

SEM LÍDERES

pela necrose espalhada

— nossa Bela Estação, queridos! —

do Sistema

de auto-Colonização,

Esquartejamento

& Vazio

 

Uma Metástase

feita em CANÇÃO

Primavera do Cânhamo

& do Grito

A valsa anárquica dos Povos

em uma inquietante

comunhão

de Impossíveis.

 

 

 

 

 

 

PERDIÇÃO

 

 

Suas impávidas mãos acariciam meus gárgulas

& fazem as madrugadas estremecerem

sob chuva, sob as vozes das putas,

sob a enxurrada da pobre música

que nossos ouvidos mastigam com tanta dificuldade

Mas, óó... nossas mãos bailam em frenesi...

Equinócios & auroras boreais vivissecionadas no caos de nossa saliva

piadas atiradas a torto & a direito

Luzes abafadas & gritantes de acordo com a dilatação das veias

nossas estórias confundidas com o fluido da cerveja

ou com os olhares alheios desejosos

de te comer inteira

 

Querem eles — como eu —

beijar tua carne como polvos famintos

ou estrangular suas presas como brutais guerreiros

em nome de um Amor nunca Visto?

Ah, arranco meus olhos

— vagando em lúgubre terreno hostil

como vaga-lume bêbado —

& te arranco das expectativas

para — sob forte temporais —

golpear a raiz do nascimento

dos homens.

 

 

 

 

 

 

VALSAS AMORDAÇADAS

 

 

Entre cozidos olhos

sinto a pulsação dos jardins

os antagônicos fluxos invisíveis de flores

a pestilência de algum beijo esquecido

esqueço meu corpo em alguma paisagem de ruminações etéreas

Logo eu que toquei a coluna vertebral do Sol

& acolhi os cardumes de luz

com tanta gratidão & benevolência

Se tudo pudesse sorrir como música

se os felinos não fossem tubarões para os ratos

& os acordes das multidões não fossem indecifráveis

Sentiria o gosto claro da vitória de toda & qualquer revolta

Os espelhos refletem os antigos séculos

as roupas traduzem desejos mutilados

meus dedos traficam & trancafiam sintonias

em redes de palavras

num vasto subterrâneo de motivos

Ah, ardam canções

bradem em mim a foice da renovação

como a carta do Tarô de Marselha

& respingue em mim o mais ardente devir

Me doo por inteiro ao Absurdo de estar vivo

mesmo sentindo que por baixo dessa respiração

não existe uma metafísica correta

ou um assoalho de significação absoluta

Coroarei meus instintos

com a beleza de um vandalismo visionário

& quem sabe assim

dance essa valsa com a Rainha

além da cardíaca finitude das coisas humanas.

 

 

 

 

 

 

MANIFESTO DOS MIL KARMAS ELÉTRICOS

 

 

Todo poeta é um inútil para a sociedade. Um músico dos ventos que atiça os tornados & os vulcões & com o magma de seu sangue dissemina rajadas quânticas de prazer.

 

Todo poeta é um pequeno demônio infame cheio de amor

incompreendido/incompreensível. Mas, também, o anjo da aurora, da alvorada, com sementes de boas intenções.

 

Todo poeta que não MUDA A VIDA traiu o genoma da poesia.

 

Todo poeta que anda bem arrumado & nunca sofreu de amor ou mesmo de pânico em situações sociais também nunca terá a autoridade para ferver seu crânio com palavras bonitas & cuspir no papel.

 

Todo poeta que não sente o cérebro vomitar & os poros arderem de desejo não tocaram ainda no Ponto G da poesia. Entregar-se ao Cosmos ou a uma Mulher é um imperativo. Que seu peito estava pronto para flechas ou beijos, eis o fundamental.

 

Todo poeta que nunca arrancou os olhos como Édipo-Rei não saberá manejar a metralhadora poderosa & infame que possui em sua língua!

 

Todo poeta que se gaba de tal ou qual coisa apenas para fazer pose de fodão é apenas um masturbador precoce. Se livrem desses escrotos!

 

Todo poeta que nunca entrou em crise com a escrita & que acha que tudo são flores — inclusive o que passa no canal de esgoto — também não merece um pingo de atenção ou consideração. Eu atiraria sem piedade em tal Bu(n)da sem veias!

 

Todo poeta que escreve livros para vender — simplesmente — também não merece o meu respeito. Quero livros que exalem a loucura, o delírio, cuja figuração & imaginação TRANSBORDEM tanto quanto a dose de vodka que acabei de encher ao lado deste computador! Quero livros que suspirem, que me façam gemer, gozar & foder & continuar fodendo por dias seguidos sem sair da cama — apenas para trocar as posições, claro! Quero livros que me assaltem, que tomem minha vida, que me faça de refém por puro amor, que me ate a um piano de caldas & toque & toque fogo em mim & no piano!!

 

Todo poeta que desconhece a música dos versos, a entranha musical do Verbo, que nunca viu o sol nascer com os olhos marejados & injetados de colapsos solitários, fraturas amorosas, odes desconhecidas & adiadas, vendadavais, viagens & sonhos... aqueles que nunca ergueram a coluna rente ao SOL & o tomou para passear como seu cachorrinho, aqueles que nunca mijaram na lua ou copularam em lugares amplos & abertos, esses jamais terão o meu respeito & carinho.

Afinal, com tanta imaginação é nosso dever deixar de reproduzir fotografias mortas ou condicionamentos primários & começar a falar abertamente da VIDA livre & selvagem-pulsional na qual nossos instintos são flores carnais, nossos instintos são sonhos encarnados. E que nenhum mantra pode cristalizá-los sem apertar o nó górdio em seu coração & fazê-lo sangrar!

 

HALLELLUJAH, irmãos... que façamos nossos corpos brindarem ao Desejo, ao Amor, pois eis que somos frágeis Deuses no escuro... suspirando em delírio...

 

 

 

 

 

 

ESPONJAS DE KRISHNA & EXU

 

 

Os planos evaporados da meduza

abalados em fútil revolta

fremiam nas rugas das garotas abusadas

o cuspe da infância pregado nas paredes

em conservadores porta-retratos mudos

os bêbados terminais em meu glaucoma médio

estudados como uma ereção inata

crisálidas sangrando revolviam

entre os flamingos

Os paus das estátuas de Dada eram traficados

enquanto espancávamos as gueixas

ao som de mico-leões dourados

Pianos embebidos em pólvora & tesão

ensurdeciam meus vizinhos

luzes caindo em plácida harmonia

com a gargalhada de Buda & o olhar do gato egípcio

facas gritavam nos becos

a indústria marginal da nova Morte

& eu estava apenas delirando

com uma metralhadora cheia de Amor

na alta madrugada...

 

 

 

 

 

 

DIMANCHE FRENETIQUE

 

 

Hoje abri as veias para que as mãos das Ninfas

passeassem sem mistérios

& fervessem elas mesmas as próximas canções

que um dia serão regurgitadas em livros

ou serão esquecidas embaixo de alguma pedra

Como preferiria Han-Shan

& as Ninfas vieram & fizeram amor comigo

em guerra, em agonia

sob múltiplos olhares & incensos de maconha

carreiras de pó estiradas numa mesa próxima à estante com livros marxistas

& um free jazz rolando loucamente numa noite interminável

As ninfas & suas vulvas quentes & seu hálito de promessas efusivas

& assim foi que me embriaguei na solidão da gestação

desse poema

& fiz o que tinha que fazer

 

 

 

 

 

 

RASPUTIN TOCANDO JAZZ NO ÁCIDO DESESPERO DA NOITE

 

 

Deito-me na vastidão da tua lástima

no teu olhar corrompido pelas sementes de pássaros alheios

no teu hímen-terra comido pelas baratas ao meio-dia

pedaços de pão com telefones riscados & vozes além-túmulo

Deito-me na areia dos eletrodos ofuscando canções de ninar vindas do sol

rabisco borboletas bêbadas em etrusco

soluçando sem parar de compor

a mais rica desarmonia

inalcançável a tatos nus

Deito-me em esplêndida miséria balbuciando teu sagrado nome

acariciando ogivas nucleares no meu sexo

& despertando de uma longa intransigência

rumo aos Campos da Luz

 

 

 

 

 

IkaRo MaxX, artista multimídia, xamã (no melhor sentido Campbelliano), poeta & escritor nômade. Nascido num inferno tropical chamado João Pessoa/PB. É autor dos delitos literários Um Cristo Cuspido no Espelho do Século, Reiki de um Homem Bomba, Manifesto Niilista & outras Cacofonias, Ossos da Primavera, Jardins Sujos (edições marginais), além de algumas telas & performances. Coleta epifanias desde que saiu de casa sem permissão, aos 14 anos. Os roteiros foram diversos: Campina Grande, Areia, Cajazeiras, Recife, Garanhuns, Gravatá, Fortaleza, Palmas, Natal, Salvador, Maceió, São Paulo, Rio de Janeiro, Niterói, Porto Alegre, Manaus, Paris, Lyon, Toulouse, Londres, Lisboa, Bruxelas, etc., transformando cada grão tóxico da existência em algum tipo de deformação estética & loucura literal.