MAGA
Para Silvana Guimarães
Os passos menos voluntários
em canto de rua, nesga de lua,
em chão sem resistência,
anunciam uma presença.
É ela que geme, que ondula,
mistério do vento leste
soprado, em mínimo frêmito,
à pele dos manacás.
Os bêbados derradeiros
aos quais os bares fecharam
as portas tardias e caras
conhecem seu nome secreto
e o invocam, por momentos,
ao insondável do vento.
Pousa seus dedos de anéis
em testas febris, exaustas
de escavar o impensável,
e à carne opaca, cativa
diz que o espírito, em verdade,
é uma desmesura viva.
Vem de úteros remotos
e quer nos assegurar
que há rios de leite no escuro
e o chão é tampa do mar.
Mas passa despercebida
entre móveis, geladeiras,
carros, efígies, casas,
feito um dom clandestino
que, temível, conduzisse
à perda e ao desatino.
E não comove os ouvidos
com a canção de infinito
soprada por sua flauta,
caniço, resto de lata.
Não pode com nossos nomes,
apropriações e medidas
e fica, em frestas de sonho,
a esperar, pequenina,
que a invoquem, de repente,
para uma noite sem peias
em que se esgotem os morangos
dos quais as trevas andam cheias.
[Do livro Florir no Escuro. Lançamento em 2016.]
maio, 2016