Líquida
As pedras
que deixei pelo caminho
desenharam a curva do rio.
Ismália
Porque há ressonância
e o azul
é a cor que oxigena.
Hera
o pior
da dor
são os tentáculos
Móbile
despir minúcias
ouvir lonjuras
pender o chão
Fotograma
É um rito
um silêncio
um grito
e não há mais vento.
Há um alicerce de palavras me perdendo.
Calefação
Os pés cansados:
cadafalso, candelabro.
Pisar minúcias
nas costas, o mundo
os filhos nos braços.
E você diz que a mulher deve ter pés delicados.
Chove
eu não saberia da chuva
não fossem os sapatos novos
encharcados
sob a marquise tentamos cerzir distâncias
corpos excluídos que nada sentem
nada temem
assistimos enlatados à expulsão dos ratos
ao correr dos moços e suas carrocinhas
então voa um corpo, e volta
voa outro, e volta
e outro
e outro
nenhuma estrela, a civilização: este desenho
estes olhos.
esse espaço decantado
esse abrigo de pés
essa enxurrada
essa consternação
Para não morrer de amor
Decantar o verso.
Sorver da folha seca
: a seiva.
Haurir o orvalho
da pedra
chegar
antes
e dissecar
sapos idealizados.
Corpo
É sempre inverno em mim
e tudo são sinos, tambores
sina
querência de toque.
Coisas que
arfam chispam
olhos que leem
regaço
remanso.
Dança
Para Murilo Mendes
Acalanto
Acalento
o som das conchinhas
trazem-me o mar de dentro.
[Despertam-me rosas de espumas
à altura dos quadris]
Então sou a borboleta marinha que dança
a infusão dos elementos.
Breve estudo para gota e mar
Para Norma de Souza Lopes
E porque houve o dia
em que alguém enxergou
minha miserável grandeza
e porque houve o dia
em que vi a sereia
de carne e concreto
pulsando na praça
E o que quer a gota
senão essa armadilha de mar
esse susto fremente de correnteza?
Voo
vê, são flores
mas parecem palavras
voando
à procura de pouso.
Miosótis
São duas luas
e um rio
para atravessar
no azul desta noite outono.
Macondo
Haverá um tempo
Em que não será preciso
Dormir
Não haverá ninguém
A tocar os címbalos
E a memória não será um tempo
E sim
O lugar
...
O que espero?
alguma palavra egressa
marulhenta
feito grunhido de mar ou vento
abrupta palavra
entre língua palato dentes
palavra de morrer
feito espuma
em canto de boca.
[Poemas do livro Pés]
junho, 2016
Adri Aleixo, mineira de Conselheiro Lafaiete, vive em Belo Horizonte onde atua como Professora e Consultora em Linguagens. Edita o blogue www.petalas-poeticas.blogspot.com e possui textos publicados em sites e revistas literárias. Escreve também contos e literatura infantil. Publicou, em 2014, Des.caminhos, pela editora Patuá e, em maio de 2015, o livro ecológico Pés, ambos de poesia.
Mais Adri Aleixo na Germina
> Poesia