A disciplina da delicadeza
A disciplina da delicadeza
(não distante
do dinamismo da dedicação)
propicia
passagens profícuas, acordando
uma saúde
sincopada — mas ainda
assim
incisiva: o cuidado
de cultivar
a acolhida desbasta
toda
ameaça de asma.
Palavras aparecem de surpresa
Palavras aparecem de surpresa
no fundo
do diafragma, batendo
as barbatanas
com algum
fulgor;
palavras aparecem
de surpresa: o corpo só
assim não
se despedaça — escoltado
por
carências sempre
concorrentes
(e nenhuma
escassa).
Ampliando as possibilidades
Ampliando as possibilidades
de contágio, perdi muitos dentes
— contudo mais
desejos me fecundaram
(impacientemente).
Enquanto ainda respiram
Enquanto ainda respiram
— isto é — enquanto
incessantemente ressuscitam,
as ondas debaixo
da pele dissolvem não poucos
nem parcos
limites: acessando (assim
que acaba
todo lucro) ritos prontos
para gozar no
mínimo em mais
de um mundo.
Forçando a asfixia
Forçando a asfixia que
desidrata toda possibilidade
de conturbação,
movimentos subterrâneos
disseminam
vozes milimetricamente
indóceis
— até banhar (com
combustível)
todo o rebanho:
dos fetos
aos fósseis.
O que emerge da urgência
O que emerge da urgência
carrega consigo
embates indispensáveis:
seus pulmões
— mesmo soterrados —
arriscam
outros ritmos (em rituais
prementes
mas compactos).
Fissuro antes de tudo
Fissuro antes de tudo
aquilo cuja fixidez me asfixia,
durante
o exercício — algo turvo —
de ser
mais que carne
na boca (sísmica)
do dia.
Imergir em seu fôlego
Imergir em seu fôlego;
as mãos,
as línguas todas estendidas —
ato que começa
e recomeça no miolo
das moléculas,
na palma (ou placenta)
de
cada partícula:
em doses
densas.
Corpo
Corpo, isso que nunca
se contenta; distante de qualquer
alívio, praticar
outras
premências — propagando
um desapego
ardido.
Algumas fragilidades
Algumas fragilidades
nos fertilizam, ainda que
não faltem
feridas — sem refúgio
após
a fuga: afetos
são fendas
famintas.
A tenacidade
A tenacidade, enigma
mobilizador — sem regresso
ou resgate: expor
a quietude à inconsequência
do amor (com mãos
mais volumosas
que violentas).
É quando o sangue surge
É quando o sangue surge
que toco a testa
da quietude;
é quando o sangue surge
que encosto a testa
na quietude:
acontecer não termina —
mistério
e alimento: uma mesma
usina
(vasta porque
esquiva).
março, 2019
Casé Lontra Marques nasceu em 1985, em Volta Redonda (RJ). Mora em Vitória/ES. Publicou Desde o medo já é tarde, O que se cala não nos cura e A densidade do céu sobre a demolição, entre outros livros.
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