Quando tudo acaba, fico normalmente doente
dessas doençazinhas de criança
febrículas, dorezinhas itinerantes
toda hora num lugar diferente

Quando tudo acaba e é primavera
sopra um vento estranho
desses de filme noir
uma sensação expectante

de não entender nada
do muito que fica no ar.




pelo olho giramundo
um buraco no escuro
transitam sombras

pende um corpo
parapeito imundo
de onde se jogou
da janela para o mundo.

Ela lia muito e gostava de escrever. Achava interessante a idéia de escolher um dia para morrer, como se pudesse antecipar-se ao próprio Deus e em apenas uma parte de sua vida pudesse fazer uma escolha, uma escolha só sua, sem fatalidades, sem a natural hora da morte. Escolheu um dia e se matou. Antes deixou diários fragmentados, coisas de criança, um esboço de livro, poemas, alguns amigos, um gato e sua coleção de canetas.



repousa mudo
esse esqueleto
reflexo frouxo
desnudo

amarelam flores nas mãos

luvas macias
angústia requintada
aperta suave o pescoço

quebro ossinhos
de galinha
e a sorte é sempre a mesma o


f
u
n
d
o

d
o

p
o
ç
o
Andréa Augusto é carioca e vive no Rio de Janeiro. Escreve o blog Literatus — http://www.literatus.blogspot.com — e é webdesigner e webmaster de alguns sites na internet.