EGO DE AMOR CEGA

 

De amor cego, morcegos se emancebam,

se emancipam em cima da macega.

E sem sunga e sem tanga, eles segredam:

— Sugar sangue da sanguessuga cega...

E enciumados do eco que lhes segue,

se agregam em cio, assim, às cegas...

Mas na cena seguinte eles sossegam.

 

 

 

 

 

 

CATAR-SE

 

Estender a pele do destino

debruçar-se em sábia sobriedade

sobre os dias tidos mal-passados

no passado de torto itinerário

recolher os dados necessários

para armar inquéritos mais sérios

que apurem saldos e contrários

e desfaçam empeços manifestos

de erguer-se em célebres risadas

pra ruir de vez a dor que infesta.

 

 

 

 

 

 

FLORIFRUTÂNSIAS

 

Cores perfumam o intuito

de plantas corridas a vento

que, de puro alegramento,

acenam lenços de flores

e atiram nas outras tantas

o pólen tinto de intentos

de um dia futuro estar

no ar com ares de fruto.

 

 
 
 
 
 

CELEBRAÇÕES

 

— I —

 

Reuni ilhéus e selenitas

num Bordel de gregos e troianos

onde pode enganar os desenganos

e esganar a agonia que engoliu...

Sei que usou o improviso para o riso

assim como o decoro para o choro

para a cura a loucura do cachorro

e os soluços do gozo de algum rio.

Quanto todos ponteiros lhe apontaram

e a alma, mais calma, se despiu

madrugada passou pelo retrato

e a bailarina vermelha teve frio.

 

 

 

 

 

 

CELEBRAÇÕES

 

— II —

 

 

Certa feita foi feita a torta certa

e o corpo do porco posto em postas

junto ao bolo, velinhas acendidas

e comidas, e bebidas, variadas...

Os convivas com vivas gargalhadas

e antigas cantigas impossíveis

enxugaram milhares de garrafas

enxergaram mulheres por girafas

deram vivas aos noivos invisíveis.

 

 

 

 

 

 

SETÊMBRIAS COM LUZ

 

 

— I —

 

Com seu vestido de luzes

a aurora às vezes demora

menos de quarto de hora

tirando escuros da sala

depois desmaia no claro

fingida de ida-embora.

 

 

— II —

 

E o sol asas de fogo

açula o vento que canta

e faz com que plantas dancem

e brinquem com suas sombras.

 

 

— III —

 

Rios que correm de encantos

cantam nas pedras que gastam

e estas, quando dispostas,

visgam de risos, se gostam.

 

 

— IV —

 

Percebe-se borboletas

cheias de sede de cores

bebem pudores de flores

boquiabertas de sede...

 

 

— V —

 

Suaves naves de nuvens

nos ares se locomovem

se alegres, festam de sol

se tristes, chovem e fogem.

 

 

— VI -

 

À tarde as horas demoram

buscando a noite distante

e o dia sujo de sangue

desliza pelo horizonte...

 

 

 

 

 

 

Altair de Oliveira nasceu em Panorama/SP, em 1961. Foi criado no noroeste paranaense (Xambrê) onde estudou, escreveu seus primeiros versos e trabalhou na lavoura até os 17 anos. Em seguida, mudou-se para o Centro-Oeste, onde permaneceu por 10 anos (Dourados e Campo-Grande, Cuiabá, Goiânia e Brasília). Fez suas primeiras publicações (Fases, 1982, e Curtaversagem ou Vice-Versos, 1988) e freqüentou o curso de Direito até o sétimo semestre. Em 1988, mudou-se para Curitiba/PR, onde trabalha como técnico em telecomunicações. Morou em várias cidades do Brasil e exterior (Alemanha, Venezuela, EUA e Nicarágua). Publicou o seu terceiro livro de poemas, O embebedário diverso, em 1996, com segunda tiragem em 2003. Escreveu alguns contos esparsos e resenhas literárias, publicadas em antologias e diversos jornais do país. Atualmente, prepara a publicação de um novo livro, O lento alento.