(Versos 115-32)
Mas
conheça o caso de Cláudio, o quase-divino, Por exemplo: assim que
adormecia, Messalina — Que preferia colchão de palha a leito
imperial — Escapulia do palácio, augusta rameira, Com capote e
capuz, sozinha ou com uma aia, Nos cabelos negros uma peruca
grisalha, Rumo ao bordel malcheiroso e abafado, com
cela, Privada e tabuleta à porta — Licisca, a Loba —, Os bicos
dos seios pintados de ouro, o ventre (Que gestou o generoso
Britânico) à mostra, Para quem quer que viesse e para quem
pagasse. "Hora de fechar!" — gritava o dono-cafetão; "Que
pena!" — respondia, sempre a última a ir-se. E ia triste, a
xoxota a pulsar de tesão, Cansada e insatisfeita, o rosto
fuliginoso Das lamparinas a impregnar o paço real Com a
sujeira, com os fedores do puteiro.
(Versos 32-3) (O Imperador Domiciano)
A fértil cona de Júlia, a sobrinha,
abortava Fetos e mais fetos escarrados de seu tio.
(Versos 133-41)
Não há por que falar de feitiços, elixires, Ou
de poções letais da madastra aos afilhados: É o sexo que leva a
mulher ao crime, a luxúria. Por que o marido de Cesênia a tem por
santa? Ela lhe deu um milhão: é o preço da pureza. As marcas,
as olheiras fundas, o fogo aceso Pouco têm a ver com amor, muito
com dote. A tal preço, ela é livre, pode marcar encontros Ou
receber recados do amante, na presença Do marido: quem é rica e
casa com pão-duro Pode reclamar os seus direitos de
viúva...
(Versos 186-99)
E tudo em grego, Não fosse vergonha maior
ignorar latim. É grego pra tudo: ódio, alegrias, problemas, Os
sentimentos mais íntimos. E ainda há mais: Transam em grego...
Dá-se desconto, se são jovens, Mas há quem agüente uma velhota
babujando "SOE KAI PSYCHE!" (Minha vida, minha alma!)?
Ninguém Resiste a sussurros lascivos: eles têm dedos, Mas por
mais que sejam carinhosos seus murmúrios Imitando a mais sensual
artista de teatro — Sobretudo em grego — nada feito. Com
efeito, A sua cara não pode remarcar os anos.
(Versos 268-85)
Está sempre quente a cama onde se deita uma
esposa; Brigas e pontadas dizem que dali o sono Se foi. E ai
do marido se ela lhe vem pra cima Como tigresa privada dos
filhotes: como Dois e dois são quatro, é porque oculta uma
perfídia; Inferniza-o, maliciando sobre amigos Ou uma suposta
amante, copiosamente Derramando lágrimas adrede armazenadas E
encomendadas, para enconbrir a própria culpa. E o tonto do
marido, crente que são de amor, Acode aos beijos, para
enxugá-las. Uma devassa Em suas gavetas e diários logo
diria Dos torpes compromissos da adúltera
ciumenta. [...] Em descaramento, ninguém supera a
mulher Pega em flagrante: a chispa da culpa põe mais fogo Em
sua fúria, em sua imaginação.
©tom
schierlitz
(Versos
300-13)
Liga pra alguma coisa a
mulher que ama e bebe? Troca as bolas, não distingue o de cima e
o de baixo. Quando deglute dúzias de ostras, noite
adentro, Regadas a falerno perfumado, sorvido Em conchas
espumantes, enquanto o teto gira, A mesa levita e tudo o mais se
vê dobrado. Pois, então, suspende dos risinhos
zombeteiros Dessa Maura, se passa pelo velho oratório Da deusa
do Pudor, ao lado de Túlia, irmã De leite. De noite, é ali que
param suas liteiras Para mijarem, inundando a estátua da
deusa Com esguichos de urina. À luz da lua, as
duas Atracam-se, transam, voltam pra casa. Você, À luz da
manhã, em visita a nobres amigos, Patina na urina da esposa, pelo
caminho.
(Versos 366-73)
E há aquelas que adoram os eunucos glabros, De
beijinho doce, sem barbas que piquem — e sem Perigo de aborto.
Mas o máximo é aquela Cujo prazer foi castrar seu escravo já
púbere, Um negro avantajado: esperou que os
testículos Chegassem a quase um quilo — e o passou às mãos Do
cirurgião. Só os barbeiros reclamaram...
(Versos 487-507)
Mas se quer se arrumar melhor do que de
costume E está atrasada e alguém a espera no jardim Da praça,
ou junto ao suspeito santuário de Ísis — Pobre da escrava que a
atende! Puxa-lhe os cabelos, Rasga-lhe as roupas, deixa-a quase
nua: "Por que Essa mecha não está no lugar?". E tome Lambadas
de couro cru (pelo cacho rebelde). Qual o crime de Pseca, onde a
culpa, se à dona Não agrada o próprio nariz? logo, uma outra
escrava Enrola o cabelo do lado esquerdo, capricha Nos cachos.
É chamado um conselho consultivo, Presidido por matrona
venerável, marca Materna, promovida de grampos e
alfinetes. Fala primeiro, falam depois as subalternas Segundo
a idade e a competência: estão em jogo, Mais que o renome, a
vida: como luta a mulher Pela bela aparência! Mas veja: o
edifício Do penteado parece escalar tantos andares, Que a
portadora adquire umm porte heróico — de frente, Ao menos. Por
trás, é outra. Mas se a natureza A fez baixinha, pigméia (sem
saltos altos), Pontinhas dos pés pra ter um beijo, que
fazer?
(Tradução de Décio
Pignatari) |