par ou ímpar
bem
casados
para os quatro
cantos do mundo
desunidos
pelos
quatro
cantos da casa
na cama de
casal
dormem
e sonham separados
duas margens
quando o tempo
me
cobrir os céus
com a anágua suja
da tua espera
e teus
lábios
forem duas margens
um
gritando
calmaria
outro
clamando tempestade
eu voltarei
de corpo
e barco
e por ti
seguirei minha viagem
navegarei
entre
teus braços
e segredos
eu
serei teu búzio
tu
serás o
meu degredo
(Poema
musicado por Chico César)
cabo branco
extremo Cabo
Branco
estranho trampolim
ao contemplar o Atlântico
o mar
mergulha em mim
memória das águas
sei do mar
do
seu sal
suas palavras naus
e toda paisagem
uma vista de
Portugal
sei do mar
do seu
longe
sua história mangue
e o mergulho das ondas
numa
linguagem lusitana
sei do mar
que o
mar
ainda é um silêncio
e a palavra mar
um oceano de
palavras
maria das águas
eu sou
Maria
das Águas
nome e fado
que a mim
me foram dados
pelo
movimento
dos barcos
eu sou
Maria das
Águas
desde Maria menina
quando só Maria
e ainda
pelo
mangue
sob os céus
brincava
de transportar nuvens
em
barcos de papel
dos meus nada
sei
salvo o talvez
tenham ido
nos barcos de
antes
e tenho uma vaga
na
lembrança
que ainda de laços
sargaços e tranças
já tentava
esse mar
sem ser de mais dadas
a cada maré que vinha
Maria
eu ia
tomando corpo
e o cais tomando gosto
pelos prazeres
Maria
que ao porto fui servindo
antes do vinho
da primeira
sangria
e foram
tantos
quantos os barcos
que a mim me chegaram
com suas
almas
nos mastros hasteadas
e foram
tantos
quantos os barcos
que em mim me deixaram
sem
velas
e com enjôo dos mares
me chegavam
com
suas falas diferentes
com seus falos urgentes
e me vestiam a
rigor
para suas fantasias
eu me despia
eu me
vestia
eu me trocava
(enquanto suas mãos
em meu corpo
faziam cruzeiros
eu contava as estrelas)
onde sou lodo
fui
veludo
leito de tantos deleites
pelos quatro cantos
do porto
para os quatro
cantos
do mundo
confesso que
vivi
confesso que bebi
goles e goles de mar
até o mar
derradeiro
até saber-me sozinha
até beber-me Maria
garrafa
sem mensagem
de mim
todos os
barcos já partiram
e sou só ruínas
de um corpo antigo
onde
marujos saciaram
suas sedes
aos beijos no gargalo
de minha
boca
resta em mim
o que
esqueceram
em mim
as marcas de mastros e
dentes
a ferrugem das âncoras tatuadas
um iceberg no copo
d'água
e o endereço de um mar
veio de mim
esse
mar
que hoje bebe
veio de mim
esse
mar
de amar sobejo
veio de mim
ser de
Maria
Maria das Águas
Maria que canto
com
olhos
que olhos d'água
e quando rio
eu rio
doce
orvalho na lágrima