:
Xeque

Dilema concreto:
ser aquilo
a litro
ou a metro?
Torção

O dia começou
do avesso.
Talvez termine
direito.
Classificados

Troco, por motivo
de paixão:
sossego por angústia
desejo por espera
riso por solidão
juízo por loucura
real pela quimera
razão por ilusão
corpo por saudade
silêncio por alarde
prazer por tensão
calma por espasmo
beleza por sofrimento
luz por escuridão
vida por marasmo.

Não aceito sentimentos
de maior valor.
Idade

a alma engorda
o corpo transborda
a vida emagrece
Crime

Fria e deliberadamente
cometo um assassinato:
deixo amor morrer à míngua.

Declaro independência e morte.

Escrevo outra língua,
uma língua bem pouca.
Faço-me surda, analfabeta
e mouca, não ouço gritos
nem o desespero aos berros
da minha dor em negrito.
Dor abafada, enterrada
na parede viva
do músculo cardíaco.

Foi amor de palavras
e não há de custar
a morrer sem escândalo,
sem que percebam
seu tamanho infinito.

Mas eu sei. Só, eu sei.

Meu último amor
nasceu em estertores
de ilusões maduras
e parcas esperanças.
Amor sofisticado
e muito mais dolorido
ao afrontar a lucidez apurada,
a ciência de muitas histórias vividas.

Revolução tardia
esse amor minguante.

Translúcida exuberância,
foi inesperada travessia
de espelho impróprio
em total semelhança.

Morre, mesmo assim,
o maior amor em mim.
Sem um único gesto
de inútil evitação:
não tem mãos o coração.
Wael de Oliveira recebeu, ao nascer, um nome misturado. Força daqui, encaixa dali, levou alguns anos pra que a maturidade viesse ajudar a cavar um lugarzinho. Psicanalista, mãe, professora universitária, mestre em História, publicou apenas textos técnicos. A poesia sempre foi uma forma de buscar entender o mundo, ainda enigmático depois de tanta idade.