leo brizola | autorretrato (detalhe) | ast, sd
 
 
 
 
 
 


 

O poema

 

 

 

 

 

Razão

 

 

A extraodinária tradução de Augusto de Campos para o poema cummingsiano "l(a" (ou: "haicai da folha que cai", como o denominou o próprio Augusto) sempre me pareceu "A" tradução daquele poema. Qualquer tentativa de trasladar tal objeto verbal tão magnificamente perfeito, da forma brilhante com que Augusto o traduziu, soava tarefa quase impossível.

Para quem ainda não conhece, eis a versão do autor de Viva Vaia:

 

 

 

 

Contudo, numa incerta noite, me peguei olhando e reolhando para o poema e cismei que deveria tentar. Arriscar. Jogar os dados e ver o que rolava.

Os primeiros resultados foram estes:

 

 

 

 

 

Na primeira versão (A), pensei em começar sugerindo a leitura da palavra "suma", com suas duas possibilidades de leitura: suma (verbo sumir) + suma (essência, resumo). Tratando-se de um poema sobre a solidão, achei que o verbo "sumir" se encaixaria bem nos sentimentos do sujeito poético. E "suma", essência, é o MEU sentimento quando leio o poema cummingsiano. Ele é a essência, o resumo, o sumo do que é a poesia.

Nas seguintes tentativas de traslação, resolvi introduzir uma interjeição ("ó"), que não está no original, mas que me pareceu coerente com a experiência do eu-lírico naquele momento de insight poético. Além disso, o "ó" possibilita a leitura (óbvia) de "só", a solidão-tema do poema.

Nas terceira e quarta tentativas (C, D), utilizei o éle (l) como o número um (l), recurso que já está no original e que Augusto utiliza muito bem na sua tradução.

Na versão D, tentei representar a solidão do eu-lírico na linha ")o(". O "o" cercado pelos parênteses invertidos simbolizaria o sujeito solitário em meio a um mundo que lhe dá as costas (como os parênteses que não o englobam, mas o mantêm do lado de fora, "à margem da margem").

Finalmente, na tradução final (pelo menos até agora), me veio a ideia de substituir a linha ")o(" por ")l(", o que foi propiciado pela troca da palavra "solidão" por "solitude". O ")l(" amplifica a simbolização da solidão, posto que, no lugar do “o”, temos o numeral “l”, representando o indivíduo em sua ímpar e indivisível solidão.

Para encerrar, uma homenagem a cummings e — por que não? — a Augusto:

 

 

 

outubro, 2009
 
 
 
 
Paulo de Toledo (Santos/SP). Poeta, pesquisador e ensaísta. Autor de 51 Mendicantos (Editora Éblis, 2007) e da plaquete de poesia visual, Desequilivro (2008), em parceria com Rodrigo de Souza Leão. Escreve o blogue Poesia e Outras Bobagens.
 
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