Eliane Velozo pelo fotógrafo português Antonio Vieira da Silva, Lisboa, Portugal, 2009

 
 
 

 

 

 

 

José Aloise Bahia – Eliane, como foi o seu começo, o desejo e a escolha pelo reino das imagens?

 

Eliane Velozo - Realmente eu não sei! Antes, muito antes, eu queria ser bailarina. Depois, na adolescência, eu adorava ler fotonovelas e comecei a gostar de fotografia. Na década de 1970, participei da fundação de um cineclube, em Caruaru, PE. Na hora de fazer vestibular, tentei arquitetura, mas acabei no curso de comunicação visual, que hoje conhecemos como design. Já nos primeiros momentos comprei uma câmera e enveredei pela fotografia. Achava chatas as outras opções dentro do curso, e fiz mestrado em belas artes, especificamente em fotografia. Foi fascinante pra mim! Agora não me imagino fazendo outra coisa. Tenho um processo muito rápido de criação de imagens. Meu cérebro parece ter um DVD, repleto de cenas, rodando todo o tempo.

 

 

JAB – E o seu deslocamento do Nordeste para Minas Gerais? Minas Gerais é o seu lugar de coração, além de Sergipe?

 

EV - Bem, como diz Ariano Suassuna, "Meu coração é um almirante louco que abandonou a profissão do mar". Creio que sou uma cidadã do mundo, e como tal, sempre vou estar em algum lugar onde eu tenha uma certa qualidade de vida e esteja desenvolvendo minha arte. Acredito que, hoje, Belo Horizonte me propicia isso. Meu deslocamento para Minas Gerais foi consequência de minha busca por novas paragens para meu projeto artístico, e por proximidade com os grandes centros do sudeste do país. Mas como resultado dessas minhas andanças o meu coração fica todo partido, espalhado. Atualmente, estou pensando, seriamente, em passar pelo menos três meses por ano na Europa.

 

 

JAB - Há tempos você comentou sobre um problema de visão. Melhorou? Está estabilizado?

 

EV - Isso para mim, hoje, deixou de ser um problema e passou a ser um motivador para novos paradigmas de relacionamento com o mundo. Creio que, sem essa baixa habilidade visual que tenho hoje, eu não teria aprendido as coisas que aprendi, não seria a pessoa que sou. Estou espiritualmente estabilizada, é o que considero  fundamental. Mas estou, sim, conseguindo desacelerar o processo de perda da visão que usa os olhos do rosto, com alimentação mais natural, vida menos estressante, tratamento homeopático, e uma série de exercícios visuais. Além, claro, da profunda determinação de não me sentir e nem deixar que me vejam como coitada.

 

 

JAB – Até que ponto essa dificuldade na visão ajuda ou atrapalha nas suas pesquisas estéticas, exposições e o ato fotográfico?

 

EV - Dá muito trabalho! Somente consigo ler no computador, tenho a ajuda de um programa falador, que lê para mim. Atrapalha no volume de textos que consigo ler, porque escaneio um livro inteiro antes de começar a lê-lo. Mas sou muito determinada. A qualidade de minha análise estética está aprimorada pela diversidade de pontos de observação que tenho adquirido. Minhas fotografias talvez estejam diferentes e as exposições, também. Porém não aproveito o problema visual para abrir espaço. Não uso isenção de pagamentos a que poderei ter direito, nem gosto de pedir ajuda em aeroportos ou outros lugares. Mas quando preciso de ajuda, peço sem o menor constrangimento.

 

 

JAB - Você foi casada com o grande músico e compositor Jorge Dissonância. Chegaram a desenvolver parcerias e criações artísticas?

 

EV - Várias! Durante dez anos, participamos ativamente dos projetos um do outro. Realizamos projetos em conjunto, e produzi o trabalho musical dele. O Jorge é um cara que tem percepção artística apuradíssima. É trabalhador e não mede esforços para executar os projetos nos quais está interessado. Enfim, um grande artista, parceiro e companheiro.

 

 

JAB – Eliane, como é o seu processo criativo?

 

EV - Eu estou sempre produzindo pensamento, e muitas vezes escrevendo o que penso. Imaginando projetos possíveis. Depois de triturar sensações, sentimentos, percepções, regularmente tenho ideias ou quando estou quase dormindo ou quase acordando... É o momento, creio eu, que baixo a guarda, esqueço os problemas diários, e dou passagem ao que poderíamos chamar de insight, que considero um produto natural de todo o trabalho realizado anteriormente e de disponibilidade para coisas novas. Para mim uma ideia sempre puxa outra, e preciso fazer a segunda fase do processo, de edição dos pensamentos, para selecionar o lixo, e dar novas formas aos retalhos escolhidos, que formam a textura de minha arte.

 

 

Cartaz da exposição "Sonho Branco", Galeria de Arte SESIMINAS, Belo Horizonte, MG, abril de 2006

 

 

JAB - Qual é a importância da luz nas suas fotografias?

 

EV - A luz e a sua ausência são a base da fotografia, que é realizada a partir do registro de quantidades e qualidades de luz existente, dos contrários entre os excessos e falta de luz, de todos os seus matizes. Hoje eu capto a luz que me é possível captar, e meu trabalho é o produto de minha forma de traduzir o mundo que me cerca.

 

 

JAB – Em sua opinião, quais são as qualidades e sensibilidades inerentes ao fotógrafo?

 

EV - Creio que disponibilidade e abertura. Mente aberta é a qualidade essencial a qualquer criador. É necessário estar aberto para perceber as oportunidades. Bebo de muitas fontes! Música, dança, cinema, teatro, literatura, e tantas outras formas de expressão que são o combustível de minha vida.

 

 

JAB - Máquina fotográfica convencional ou digital? Ou ambas? A qualidade do trabalho artístico é bem diferente ao utilizar para o mesmo motivo/tema máquinas distintas? O interessante é que ainda temos muitos fotógrafos profissionais que preferem as convencionais/analógicas: é o seu caso?

 

EV - É sim! Todo processo é muito diferente. Tenho uma Nikon FM2, que me acompanhou, sem interrupção, por pelo menos 23 anos. Ou seja, foi um olho a mais por mais de duas décadas. Eu adoro o trabalho de laboratório preto e branco, onde sou uma bruxa, e não me vejo sem ele. Porém no Brasil, atualmente, é muito difícil e caro trabalhar com preto e branco (filme convencional e papel fotográfico). Eu prefiro, claramente, trabalhar com analógica. Mas é um sonho que está virando pesadelo. Agora também uso uma Nikon digital, que estou começando a aprender a "amar" (ou não). O processo produtivo, com as digitais é muito diferente. O olhar, sentir, captar, editar. A criação compulsiva de imagens que a digital permite causa sérios problemas nos processos de edição. Poucas pessoas conseguem se desprender do lixo: jogar fora as fotografias feitas. Ainda não sabemos lidar com o excesso propiciado pelas tecnologias digitais. A relação do público com os produtos digitais também muda, porque não adquirimos a capacidade de imprimir-lhes certos valores. Não quero ficar sonhando com o mundo da fotografia analógica, porém não pretendo abrir mão de continuar exercendo o direito de usá-la.

 

 

JAB - Como é o seu modus operandi? Somente imagens naturais? Ou utiliza, não despreza a mescla de imagens reais, efeitos laboratoriais e o computador?

 

EV - Sempre trabalho com projetos. Sou incapaz de pegar a câmera e, simplesmente, sair fotografando. Durante a captação de imagens procuro imprimir-lhes qualidades de pretos profundos. Esses pretos, no laboratório, são muito trabalhosos, mas são meio que "a minha cara". Trabalho com a participação essencial de processos intuitivos. Minhas fotografias digitais são bebezinhos, recém-nascidos, e não sei ainda que rumo darei a elas. Mas continuam os processos intuitivos e os pretos profundos.

 

 

JAB – Eliane, quais são as suas influências nas artes visuais?

 

EV - Não sei se chamaria de influências. As pessoas determinantes para mim, como artistas, são não somente artistas visuais. Eu poderia citar: os fotógrafos Joseph Jackna, meu querido mestre, Evgen Bavcar, o fotógrafo e filósofo cego, com quem convivi alguns dias e que, em poucas horas, me ensinou muito e Henri Cartier-Bresson, pelo trânsito de sua obra do jornalismo às galerias; os músicos Chico Buarque de Holanda, pelo conjunto de sua obra, marcadamente feminina e John Cage, com seu minimalismo estético; Pablo Picasso por seu traço, cores e inspiração; os poetas Pablo Neruda e Fernando Pessoa, porque adoro poesia e viajo profundamente nas suas obras; e os escritores Eduardo Galeano que transita entre o realismo fantástico e a historicidade do homem, e Ariano Suassuna, o pernambucano mais lindo que conheço e que influencia gerações de escritores e artistas.

 

 

Foto da exposição "Sonho Branco", Lisboa e Porto, Portugal, novembro de 2009

 

 

JAB - Como foi a sua passagem pela Escola de Comunicação Visual da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e o mestrado em fotografia pela Universidade de Illinois em Chicago, EUA?

 

EV - Na UFPE eu entrei em uma época de lutas pela redemocratização do Brasil. Naquele período, participei do Movimento Feminino pela Anistia. Já na universidade, participei do congresso de reconstrução da União Brasileira dos Estudantes (UNE), em Salvador, em 1979, e de manifestações e organizações estudantis, no Recife. Era um tempo em que voltávamos não somente para os processos de aprendizagem curriculares, mas muito para os processos de discussão política e das lutas de transformação da sociedade. Algumas de minhas primeiras fotografias foram sobre a volta de Miguel Arraes, que havia sido exilado pelo Golpe Militar e de passeatas e comícios dessa época. Ao final do curso fiz em grupo, com Marta Velozo e Edna Galindo, um projeto que misturava fotografias e análise sociológica de algumas favelas do Recife. Nos Estados Unidos eu entrei para o Mestrado em Fotografia sem saber muito a fundo de fotografia, e em dois anos e meio trabalhei feito maluca pra aprender tudo o que já devia saber antes de entrar para o mestrado. Foram dois anos de muito trabalho, o dia inteiro entre aulas, laboratório e bibliotecas da universidade. O grupo do mestrado era muito eclético e tínhamos boas conversas sobre os trabalhos que estávamos desenvolvendo. Ao final, fiz um projeto fotográfico, em alto-contraste, com um grupo de dança folclórica mexicana. A exposição aconteceu em um Centro Cultural de Chicago. Pintamos a parede de preto, e o branco das imagens, que não tinham tons de cinza, ficou pulando naquele mundão preto. Achei muito legal o produto final, os professores, também. Em Chicago, fiz alguns amigos que mantenho até hoje. Eles são, especialmente, pessoas que têm posições críticas com relação aos comportamentos dos Estados Unidos da América do Norte em relação ao resto do mundo.

 

 

JAB - Entre 1997 e 1998, tivemos a publicação do livro Tempos de Tempo, que reúne Aracaju e Belo Horizonte. Como foi esse trabalho, deslocamento temporal e imagético? Tivemos também a exposição itinerante, que percorreu as principais cidades do Brasil...

 

EV - O projeto teve uma forma muito interessante de produção. Primeiro eu entrevistei cerca de 250 pessoas com a pergunta: "O que é tempo para você?". Depois, comecei a construir soluções imagéticas que expressassem algumas respostas. Fiz um mapeamento de como seria cada imagem, antes de pegar na câmera. Foi um processo fantástico, além de intuitivo, de racionalização, edição e construção de conjunto. A parte fotográfica foi toda feita em Aracaju. Ao final desse processo eu me mudei para Belo Horizonte e o livro foi publicado, ainda com os recursos da Lei Municipal de Incentivo à Cultura, de Aracaju. Esse trânsito, de tempo e espaço, percorrido pelo projeto, causou uma certa parada no mesmo, mas logo que o livro foi impresso, comecei a viajar com a exposição que tinha além de fotos, instalações e objetos. Foi a primeira vez que criei instalações e objetos para resolver o problema de um projeto, seus conceitos e formato. Cheguei ao ponto em que as fotografias não resolviam o que eu queria dizer e não tive preconceito algum em misturá-las com essas outras linguagens. As exposições do projeto foram muito bem recebidas. Meus trabalhos atuais, ainda continuam, de certa forma, falando de tempo.

 

 

JAB - Em seguida, 1999, com o apoio da Universidade Federal de Sergipe (UFS) e do Centro Cultural da UFMG, observamos a curadoria, intercâmbio e participação numa exposição bem variada, reunindo fotografias conceituais, fotojornalismos, fotografias da natureza e arquitetura entre mineiros e sergipanos. Como foi essa mostra?

 

EV - Tenho um pé nos projetos individuais e outro nos coletivos. Tento criar oportunidade para não deixar de montar projetos coletivos, especialmente os conceituais, pois sinto falta deles em nosso cenário artístico e tomo pra mim uma certa responsabilidade em organizá-los. Os projetos de intercâmbio propiciam oportunidades artísticas e relacionamentos. Gosto de propor temas a várias pessoas e ver como cada um os resolve. Isso também gera processos de discussão. Algumas vezes, somente a realização de coletivas já propicia incentivo a artistas, tanto principiantes como os mais experientes na vida artística.

 

 

JAB - Em 2002, você participou da coletiva internacional que reuniu 12 fotógrafos clicando simultaneamente 12 lugares diferentes do mundo no mesmo dia e ao mesmo tempo durante 12 horas simultâneas, tendo como referência o meridiano de Greenwinch e como temática central a questão temporal. O seu motivo foi o histórico Viaduto de Santa Tereza em Belo Horizonte. Como foi participar desse projeto mundial? O que levou você a escolher o Viaduto de Santa Tereza?

 

EV - Fui convidada para o projeto através de um amigo inglês, que me indicou aos organizadores. Resolvi fotografar alguma coisa que me propiciasse a utilização da movimentação do sol durante 12 horas consecutivas. Observando a cidade de Belo Horizonte, concluí que o Viaduto de Santa Tereza tinha um significado histórico, uma beleza arquitetônica e o sol ao meu dispor, durante 12 horas. Foi fantástico, inclusive porque eu continuava trabalhando minha temática predileta: o tempo. Foi fascinante saber que, simultaneamente, havia fotógrafos, cada um no seu país, produzindo imagens para o projeto. Dava um sabor de coisa gostosa.

 

 

JAB – E a fotografia experimental e contemporânea na mostra "Pasárgada", no mesmo período (2002/2003), cuja curadoria foi feita por você e o artista plástico Severino Iabá, defensor fervoroso da Arte Pública?

 

EV - Hahaha... É realmente uma tarefa árdua tirar o Iabá da rua para uma galeria. Mas ele está sempre comprando minhas ideias e eu as dele... Assim a gente acaba se entendendo na organização de vários projetos em conjunto, tanto nas ruas como nas galerias. A mostra foi uma mistura exótica entre fotografia experimental e a pintura primitivista. Ele convidou os pintores; eu, os fotógrafos. Acho que causou um certo impacto, porque as pessoas não costumam ser muito abertas a propostas tão ecléticas. Eu mostrei umas fotos absolutamente abstratas.

 

 

JAB - Eliane, você também ministra oficinas performáticas em Belo Horizonte, como "A Dinâmica dos Sentidos", privilegiando a questão dos sentidos e a natureza. A questão da ecologia é a reflexão central dessa oficina?

 

EV – É! A questão central é a ecologia, mas não o meio ambiente. Creio que são duas coisas diferentes. O meio ambiente nos parece estar lá, fora de nós. A ecologia, para mim, tem o ser humano como participante em pé de igualdade com o ambiente, contextualizado com o meio, numa visão não-antropocêntrica. A oficina trabalha a consciência de que a natureza tem vários elementos que funcionam em conjunto, e o ser humano tem os sentidos que deveriam funcionar melhor. Temos déficit de atenção, de observação sensorial, de percepções diversas. Essa oficina, creio, melhora as capacidades perceptivas e coopera com a geração de novos paradigmas para o ser humano e o planeta. Agora em novembro de 2009, ministrei essa oficina em Lisboa e na cidade do Porto, em Portugal, através do Instituto Português de Fotografia, e foi uma experiência muito boa. O trabalho foi bem recebido pelos portugueses. Levantamos questões bastante interessantes.

 

 

Foto da exposição "Sonho Branco", Lubbock, Texas, EUA, agosto de 2008

 

 

JAB – Como foi a exposição "Sonho Branco" em Belo Horizonte? E a sua apresentação nos Estados Unidos, Cabo Verde, Portugal e Recife? Particularmente, gostei muito da exposição, um exercício estético e cultural primoroso (homenagem aos avós paternos), com imagens de alta qualidade, no qual o algodão é o tema principal...

 

EV - Obrigada pelos elogios! "Sonho Branco" tem, marcadamente, duas fases. Na primeira, que mostrei em Belo Horizonte e no Recife, que foi a que você viu, as fotografias da mostra eram de uma plantação de algodão de Oliveira, em Minas Gerais. Depois, o projeto sofreu uma profunda transformação e fui ao Mato Grosso do Sul, ao Texas e ao Togo (país africano) fotografar plantações de algodão. Agora, como "Trilogia do Sonho Branco" o projeto tem a jornada ancestral, as fotos e experiências do Brasil, a jornada espiritual, que comporta a história do meu sonho com Catherine Kitten, as experiências e  imagens do algodão do Texas, EUA, e a jornada ancestral, no continente africano, nas plantações de algodão do Togo. Essa trilogia foi exposta no Texas, com trinta fotos, instalações e objetos, e somente com onze fotos em Cabo Verde, Lisboa e cidade do Porto, porque as galerias são pequenas. A trilogia agora busca espaço para ser mostrada em Belo Horizonte, Recife, Togo, etc.

 

 

JAB - E as suas andanças pela África, Togo e Cabo Verde?

 

EV - Minhas andanças pela África foram fantásticas! No Togo eu encontrei a essência da cultura de Pernambuco... A influência africana em minha cultura é muito marcante. Lá, escrevi um diário, tive a alegria de ser compreendida de forma espiritual e aprender a administrar melhor a minha própria história. No Cabo Verde, onde realizei a mostra "Sonho Branco", fiz duas palestras, uma para crianças de quinta série; a outra, na abertura da exposição, além da oficina "A Dinâmica dos Sentidos", para professores de três escolas públicas da cidade de Praia. Também fotografei 57 mulheres da Cidade Velha, a cidade mais antiga do país, que acaba de ser elevada à categoria de Patrimônio Histórico da Humanidade. O arquipélago de Cabo Verde, no Oceano Atlântico e costa Ocidental da África, teve uma importância muito grande durante os processos de colonização das Américas, pois servia de entreposto de escravos e de ponto de apoio às navegações. O povo de lá é uma mistura muito bonita de portugueses e negros. São muito gentis e adoram o Brasil, apesar de praticamente não conhecer nosso país. Praia, a capital do país, é uma cidade dinâmica e moderna. Eles têm uma experiência fantástica de inclusão digital. Na cidade existem três praças em que o uso de internet wireless é livre para todos.

 

 

JAB - Qual é o verdadeiro papel cultural e social da fotografia na contemporaneidade?

 

EV - Acho que a fotografia como forma de arte está, em nosso país, sofrendo certa desvalorização por causa do avanço da tecnologia digital, que praticamente transforma todo(a) cidadão(ã) em fotógrafo(a). Isso, do ponto de vista da democratização do meio, é muito importante. Observando do ponto de vista da proliferação de imagens, hoje existe um excesso de informações imagéticas, que cega as pessoas. O excesso faz com que não consigamos mais ver. Acredito que o diferencial dos artistas-fotógrafos é a realização dos trabalhos partindo de conceitos, de projetos norteados por percepções extra-imagéticas... Assim, como o que não está na imagem. A informação que falta. A abstração possível. É preciso notar que não estou falando de imagens abstratas, mas da abstração subjetiva, de percepções extra-sensoriais, de sentimentos que a grande maioria das imagens não comporta.

 

 

JAB – Para terminar: quais são os novos projetos da fotógrafa Eliane Velozo?

 

EV - Nossa! São tantas ideias na minha cabeça, sem a câmera na mão! Com a câmera, estou trabalhando qual formato darei às fotografias do projeto "Luz Divina", que são as mulheres da Cidade Velha, do Cabo Verde. Estou também fotografando o rio Tejo (que nasce na Espanha e tem a sua foz em Lisboa), chamado de Tajo pelos espanhóis. Fotografei três pontos do rio na Espanha, e agora estou fazendo a parte portuguesa do projeto. Isso dá início a algo maior, sobre rios. Os rios estão quase todos poluídos em todo o mundo. Creio que esse projeto vai na direção da ecologia. Não sobre a poluição, mas quando vejo as fotos do rio, que já fiz, vejo como ele é lindo... Além de ser o rio dos poetas e românticos... O maior rio da Península Ibérica. Nesse momento, o projeto tem uma visão um tanto turística do rio, já que estou em locais urbanizados, mas no processo creio que darei outra perspectiva a isso. Outro projeto é que um dia desses fui, dormindo,  sonhando, a uma exposição fotográfica com minhas fotos e eram fotos que ainda não fiz. Tenho várias delas na cabeça e creio que qualquer dia, vou buscá-las com a câmera na mão.

 

 

 

dezembro, 2009
 
 
 
 
 
 

 

Eliane Velozo (Lajedo/PE). Pesquisadora, escritora, artista visual e fotógrafa. Bacharel em comunicação visual pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e mestre em fotografia pela Universidade de Illinois, Chicago, EUA. Já realizou inúmeros projetos e exposições individuais e coletivas de fotografia pelo Brasil e exterior. Vive em Belo Horizonte/MG. Autora de vários livros, entre eles Tempo do tempo (Belo Horizonte: Editora Gráfica Silveira, 1997) e Sonho branco (Livro Agenda, Português/Inglês, Belo Horizonte: Editora Livro-Objeto, 2008).
 
 

 
 

José Aloise Bahia (Belo Horizonte/MG). Jornalista, escritor, pesquisador, ensaísta e colecionador de artes plásticas. Estudou Economia (UFMG). Graduado em Comunicação Social e pós-graduado em Jornalismo Contemporâneo (UNI-BH).  Autor de Pavios curtos (Belo Horizonte: Anomelivros,  2004). Participa da antologia O achamento de Portugal (Lisboa: Fundação Camões/Belo Horizonte: Anomelivros, 2005), dos livros Pequenos milagres e outras histórias (Belo Horizonte: Editoras Autêntica e PUC-Minas, 2007), Folhas verdes (Belo Horizonte: Edições A Tela e o Texto, FALE/UFMG, 2008) e Poemas que latem ao coração! (São Paulo: Editora Nova Alexandria, 2009).
 
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