©pedro cupertino
 
 
 
 
 
 
 

Comecei aos poucos a deixar de escrever. Pensei que meu momento de escritora já era, pois misteriosamente minhas criações começaram a correr o risco de virar repetição de outras pertencentes a mim mesma.

 

Cada dia fica mais raro eu sentir vontade de navegar na net. Não é tristeza. É tédio. Pô: enjoo daqui? Foi o virtual quem divulgou por mais de uma década meu lirismo. Quem abriu as portas de editoras levando-me a publicar livros. Por que essa quase aversão a sentar-me em frente a um computador e navegar?

 

Ontem, no almoço, meu genro chamou Dona Terezinha — uma criatura insuportável que mora em meu prédio — de Internet. É de conhecimento público que minha vizinha é um poço de mentiras, de maldades, de fofocas, de recalques, de preconceitos. Adora acabar com a festa do alheio.

 

Gritei:

 

— O quê? Como?

 

— Internet virou apelido. E não só dela, mas de todos os boateiros, encrenqueiros, fofoqueiros, criadores de caso, plantonistas da discórdia. A turma do "não a paz".

 

Percebi, naquele momento, um dos principais motivos de meu afastamento. Não consigo concatenar minha maneira de ser com o que se transformou esse espaço. Uma central de boatos e maldades. Repasses de mentiras forjadas para desacreditar pessoas sérias, deboches, agressões gratuitas, ignorância disfarçada (com o Google, todo mundo é sabichão), muita gente não lê mais nada, todo mundo só quer escrever, nem que seja um diário: "Hoje meu cão deu uma cagada mole".

 

Penso se devo continuar a escrever ou se é momento de só curtir a gravidez de minha filha e seguir com minhas aulas de ioga e meditação. Não acredito que eu ainda tenha muito a dizer (todo mundo diz muito toda hora) e me nego a fazer um diário para falar que minha tartaruga não gosta de tomate ou que minha irmã acha que calça legging lembra camisinha. Mas tenho fãs que me cobram e amo todos eles. Obrigada, Tuninho! Obrigada, Carol! Isso tem um peso grande na minha decisão de não parar. É, sem dúvida, o principal motivo desse ensaio de crônica para postar na Dona Terezinha. Não parar de vez. Não pagar o mico de dizer adeus e depois voltar.

 

Cá estou eu tentando administrar minha fase Gandhi Nietzsche com as infinitas atividades da net, como os torpedos do Orkut, o siga-me do Twitter, as cutucadas do Facebook, as travadas do Yahoo, os convites do Badoo, vou contar pra tu e tudo que rima com ele.

 

Ai! Lembrei que não posso mais falar palavrão, mesmo quando bem colocado. Carol pediu-me, por conta de meu neto que vem ai. Tenho treinado. Ontem caiu catchup na minha T-shirt novinha e consegui dizer: "Morra!". Fiquei orgulhosa de mim. Puta que pariu, como é difícil!

 

Eu gostava demais quando podia ficar olhando o bebum de plantão no bar da esquina e depois recriava a história dele. Hoje, parei de olhar, pois me veio a certeza de que meus anônimos urbanos já viraram lugar-comum. Não existe mais tempo para curti-los. Agora é só tropa de elite: Tropa de Elite, osso duro de roer! Pega um, pega geral, também vai pegar você!

 

Esta crônica, que não é nenhuma Brastemp, está mais para uma narrativa de minha desesperança no virtualismo e o inverso na barriga de minha filha. É mais para dizer para mim que outro ciclo de minha vida vai começar. Minhas letras se aquietaram, mas não se aposentaram. Meu coração ainda pulsa bem forte e sopra belos versos em meus ouvidos.

 

Quem sabe amanhã não nasce um conto? Aí eu aumento um ponto e viveremos felizes para sempre.

 

 

 

 

dezembro, 2010

 

 

 

 

Rosa Pena (Rio de Janeiro/RJ). Escritora, professora e administradora de empresas. Publicou PreTextos (Rio de Janeiro: All Print, 2004), Ui! (Rio de Janeiro: Bagatelas!, 2007) e Tarja Branca (Rio de Janeiro: All Print, 2010). Mais em seu site.

 

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