COM CUMMINGS & POLLOCK


O que é contenção em e.e.cummings, é o oposto em Luís Serguilha, ele preenche os silêncios brancos de e.e.cummings, no ato de cantar os fluxos, desenhar os fluxos do ontológico. L.S. preenche os espaços em branco arquitetonicamente, se pensarmos na fase arquitetônica citada por Walter Benjamin, como uma das fases da obra de arte em Rua de mão única.


e.e.cummings é como Pollock, seu design do espaço em branco evoca modulações de um silêncio construtor de sentidos para o abstrato. Em L.S. estes silêncios explodem e entram em tensão com o espaço, isto sem evocar o temor pascalino que é o motor de Pollock, um e. e. cummings desprovido de humor atuando com o silêncio da pintura em uma chave de tensão equivalente a de Serguilha, os três tentam controlar essa tensão, mas L.S. é o único que se importa em preencher totalmente os espaços para derrotar o silêncio.



COM ABEL GANCE & PONGE


Interessa para Luís Serguilha atualizar para a escritura o desejo de expansão de Abel Gance, que sonhava em expandir os limites da tela cinematográfica, sonhava com a expansão projetiva da máquina da interioridade do Senhor Francis Ponge.


L.S. escreve a partir de um ponto de fusão entre a expansão de Abel Gance, como uma expansão da idéia ou de idéias dentro da frase com o núcleo de uma interioridade que se projeta não nas coisas, como em Ponge, mas na própria linguagem. O resultado desta fusão é uma explosão, o raio dessa explosão é o poema.



COM NICOLAS FLAMEL


A linguagem sígnica funciona para L.S. como um Albedo.



COM AUGUSTO & HAROLDO DE CAMPOS

 

A meu ver é um erro banal associar a escritura de L.S. com o concretismo, este tem suas bases nos limites do discurso lírico, sendo suas fronteiras pautas sêcas em estado de paroxismo às avessas, diante do abismo da palavra, em L.S. não estamos nos limites do discurso lírico, mas em seu Opus.


Apesar das aparências, não existem profundos vasos comunicantes entre o trabalho de L.S. e os de Haroldo de Campos & Augusto de Campos, embora exista uma conexão formal entre Galáxias de H. de C. e Processionárias de L.S., devemos nos ater ao fato óbvio de que L.S. é um elegante construtor de enredos imantados pelo fluxo das idéias tensionadas nas frases e não um mero designer de sentidos a partir dos métodos puzzle do Sr. James Joyce como H. de C.



COM A LITERATURA PORTUGUESA


Luís Serguilha é uma espécie de Ahasverus das letras portuguesas, ampliando a chave, se entendermos o discurso poético, como uma chave, para que esta chave se torne maior do que a porta, se entendermos que o silêncio é uma porta.


O silêncio que precede o ser, este silêncio que a escritura de L.S. enfrenta, é uma porta que vai dar, não no esvaziamento melancólico-mítico & com saudade e medo das grandes águas do inconsciente, é uma porta que vai dar no abismo da própria linguagem.



COM LEZAMA LIMA  & MANGANELLI OU CONCLUSÃO QUE NÃO CONCLUI


Luís Serguilha pratica uma poética-rio, talvez a poética-rio sonhada por muitos outros, como o autor de Centúrias e da Hilariotragédia, Giorgio Manganelli. Uma poética-rio que desemboca em uma poética-oceano como a de Lezama Lima, principalmente o lezama de Paradiso. Para Lezama, a palavra é ela mesma um objeto capaz de materializar a música do pensamento, um transe do Verbo, Lezama controla o transe a partir da palavra e Serguilha se deixa levar pelo fluxo desse transe, também controlado, no caso dele, pela lógica da própria frase, como um Uroboro, existe em L.S., uma poética que morde o rabo da própria poética, não para tentar romper os limites burocráticos do próprio texto, limites burocráticos de formatação e enredo, mas para fazer do ato da escritura se converter em uma respiração do próprio pensamento voltado para seu próprio abismo, a linguagem.

 

 

 

setembro, 2010

 

 
 
 
 
Marcelo Ariel (Santos/SP). Poeta autodidata, dramaturgo e performer. Mantém, desde 1988, um sebo itinerante chamado "O Invisível". Publicou  pelo Coletivo Dulcinéia Catadora os livros Me enterrem com a minha AR 15 (2007), O céu no fundo do mar (2009) e pelo Selo LetraSelvagem o Tratado dos anjos afogados (2008). Escreve o blogue Cancelando o Teatrofantasma.
 
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