Jovino Machado – Flávia, por favor, apresente o Amaranto para os leitores.

 

Flávia Ferraz - O Amaranto é um grupo vocal nascido no seio de uma família muito musical. É, sobretudo, um grupo de irmãs, que se amam muito, e que têm a graça de viver trabalhando juntas fazendo música — outro de seus grandes amores. Mistura-se a isso um jeito bem mineiro e um orgulho danado de ser brasileiro.

 

 

JM - Como foi o primeiro contato das irmãs Ferraz com a música?

 

FF - Deve ter sido no ventre da mamãe. Ela cantou pra gente desde sempre. Nossa família é muito musical e desde minha primeira lembrança a música está presente. O violão do Tio Nando e da Vaninha (tia) na casa da avó materna, o piano do Vovô Anselmo (pai de nosso pai) e do tio Roberto. Anselmo Ferraz era um médico, nascido em Floresta, sertão nordestino e até hoje é lembrado lá, por ser o autor do hino da cidade. Papai e mamãe cantavam para nós; as histórias que usavam para embalar nosso sono sempre tinham música, canções de que nós até hoje nos lembramos. Acho que esse é o contato fundamental. O da primeira infância. Minha filha de três anos já demonstra que a música é vital para ela. O contato formal do Amaranto com a música (o início do estudo) começou mais tarde, quando já tínhamos mais de uma década de vida, mas aí já não tinha jeito: não saberíamos viver sem música.

 

 

JM - Como foi o primeiro show do Grupo?

 

FF - Quando a banda Flor de Cal acabou, da qual eu e Lúcia fazíamos parte, ficou aquela vontade de continuar tocando, e de levar a música como profissão. Isso foi em 97. Ensaiamos com a Marina um repertório para tocar no mesmo lugar que abrigou o Flor de Cal: o bar Mr. Beef. O primeiro show foi lá, em fevereiro de 1998, no piano bar. Foi delicioso. Tivemos um ótimo retorno do público e fomos mordidas pelo bichinho do quero-mais. A continuação dessa história, vocês sabem, nunca mais paramos.

 

 

JM - Cite 10 compositores que você ama.

 

FF - Esse tipo de lista dá um trabalho danado. A gente sempre exclui alguém que adora ou até mesmo se esquece de alguém de que gosta muito, só porque não "bate um papo" com esse autor há uns dias... Decidi, então, escrever o nome de compositores que já tivessem ao menos 60 aninhos (assim diminuo a lista dos injustamente excluídos na minha cabeça) e que fossem autores de belas canções ou melodias que já tenham me feito chorar ao menos uma vez. Aí vai: Tom Jobim, Chico Buarque, Heitor Villa-Lobos, Paul McCartney, Astor Piazolla, Pixinguinha, Paulinho da Viola, Cartola, J. S. Bach e Milton Nascimento.

 

 

JM -  O Djavan se manifestou quanto à gravação de Retrato da Vida?

 

FF - Infelizmente, não. Entregamos o disco a ele antes do lançamento, ele agradeceu muito. Soubemos que ele ouviu o disco pela filha dele, a Flávia Virgínia, com quem nos encontramos num show e tocamos no assunto. Quando nos apresentamos, ela disse: "Ah! Meu pai já pôs o disco de vocês para eu escutar. Ele não disse nada sobre o disco não? Êh, papai é assim mal educado mesmo..." Rs.

 

 

JM -  O que você sente quando está no palco cantando?

 

FF - No palco eu me realizo plenamente. Sinto que estou fazendo jus ao dom que recebi, satisfazendo meu desejo e compartilhando emoções com outras pessoas.

 

 

JM-  O que gostaria de ser, se não fosse cantora?

 

FF - Acho que não saberia ser muita coisa fora da música. Cheguei a pensar que seria publicitária, até me formei em Comunicação Social, mas durante o curso já intui que a música ia falar mais alto. Às vezes, trabalho com produção cultural e isso me agrada também, mas não se compara ao ofício de cantar. Se minha voz "acabasse", seria instrumentista, produtora musical ou professora de música, funções que hoje também cumpro, coisas que também adoro fazer.

 

 

 

 

 

Jovino Machado - Quem é Lúcia Ferraz?

 

Lúcia Ferraz - Sou uma menina-moça-mulher sonhadora e pé no chão ao mesmo tempo. Sou simples e feliz. Acho que a felicidade da gente está na simplicidade. Gosto das coisas da terra, da natureza, das coisas da infância. Gosto da minha casa. Gosto de cantar. A música e a família são as coisas mais importantes na minha vida, e graças a Deus, posso ter as duas coisas juntas, ao mesmo tempo. Eu e minhas irmãs cantando em comunhão. Isso me faz mais forte.

 

 

JM - Como foi a viagem do Trio para os Estados Unidos?

 

LF - Foi uma experiência muito marcante, nossa primeira viagem ao exterior. O fato de ser irmãs nos dá muita segurança, apesar do medo da novidade. Fomos muito animadas e tudo deu certo. Fizemos dois shows em Washington D.C. a convite da Embaixada Brasileira e um show em Nova York. A música brasileira é muito respeitada lá fora.

 

 

JM - Você já bebeu ou fumou maconha antes de entrar em cena?

 

LF - Não. Nós não usamos nenhum tipo de droga e bebemos apenas socialmente, com os amigos ou em casa, mas sempre depois dos shows. Gostamos de "entrar em cena" como somos naturalmente, envolvidas de corpo e alma com o que estamos fazendo, sentindo a maravilhosa e divina experiência do encontro com a música.

 

 

JM - Tem algum ritual nesse momento?

 

LF - Sim, temos. Nós sempre nos concentramos antes dos shows. Reunidos, fazemos uma espécie de aquecimento (além do aquecimento vocal) que nos prepara para o palco.

 

 

 

 

JM - Cite 10 cantoras que você admira.

 

LF - Ella Fitzgerald, Madeleine Peyroux, Diana Krall, Nana Caymmi, Zizi Possi, Elizeth Cardoso, Mônica Salmaso, e outras tantas cantoras da atualidade... é melhor parar por aqui. Difícil citar dez. O Brasil está cheio de boas cantoras. Por todos os lados. Ao meu lado tem duas, Flávia e Marina Ferraz!

 

 

JM - Como você encara o assédio de homens e mulheres, sendo artista e estando sempre em contato com o público?

 

LF - O assédio faz parte da carreira de um artista. Temos que lidar com naturalidade. É a resposta de um tipo de público que admira o que você faz. Não temos problema com o assédio. Quase sempre o assédio que o Amaranto "sofre" é muito saudável e respeitoso. As pessoas percebem a força da nossa irmandade, do nosso amor à família e ao ato de cantar.

 

 

JM - Qual é o seu signo? Sua cor? E a sua fruta preferida?

 

LF - Meu signo é Áries. Não sei se tenho uma cor. Eu adoro cor. Mas, sem pensar, no ímpeto, me vem o verde na cabeça. Quanto à fruta, outra resposta difícil. Adoro frutas em geral. Mas acho que sou louca por melancia. Gosto de fruta que tem água.

 

 

JM - O que é mais importante na vida para Lúcia Ferraz?

 

LF - A família. A família e a música são coisas de Deus. Cantar com as irmãs que você ama só pode ser coisa de Deus!

 

 

 

 

Jovino Machado -  O que te inspira na hora de compor?

 

Marina Ferraz - Muitas coisas. Pessoas, situações... a vida em geral, no que tem de belo e triste. Mas o que me leva a compor, em geral, é um sentimento que me vem sem que se deixe decifrar, um sentimento impreciso; quase uma angústia. E quando dou por terminada a criação, ele se dissolve.

 

 

JM - O que é o amor pra você?

 

MF - Amor é poesia. Pode ser pobre se não é lido com cuidado. Gosto muito do "Ensinamento" de Adélia Prado, sobre amor.

 

Minha mãe achava estudo

a coisa mais fina do mundo.

Não é.

A coisa mais fina do mundo é o sentimento.

Aquele dia de noite, o pai fazendo serão,

ela falou comigo:

"Coitado, até essa hora no serviço pesado".

Arrumou pão e café, deixou tacho no fogo com água quente.

Não me falou em amor.

Essa palavra de luxo.

 

 

JM - O que você sente quando é aplaudida no palco? Você se sente amada?

 

MF - O melhor momento no palco, para mim, é durante a música. Algumas vezes fico sem graça entre uma música e outra. Aplausos verdadeiros são muito bons, mas não são melhores do que o momento de comunhão que o cantar propicia. O amor está aí, na partilha, no cantar junto de pessoas que amo. O melhor aplauso é o do final, onde há o reconhecimento mútuo, de artistas e público, de que ali aconteceu uma entrega à arte.

 

 

JM - Conte um caso curioso que aconteceu nos bastidores dos shows.

 

MF - Enquanto a Lúcia cantava "Nuvem Negra", a alça do seu sutiã soltou. Ela cantou a música inteira com a mão no peito e os braços bem fechados. A Flávia, eu e o público pensamos que fazia parte da sua interpretação. Logo após a música, a Lúcia saiu meio depressa e pensamos que ela tinha ido ao banheiro. Nos bastidores do palco, após o show, ela nos contou que tinha saído pra consertar o estrago. A blusa transparente e o sutiã solto deram a essa música uma de suas melhores interpretações.

 

 

JM - Cite 10 cantores que você gosta.

 

MF - Djavan, Milton Nascimento, João Gilberto, Chico Buarque, Ladston do Nascimento, Renato Braz, Vander Lee, Elvis Presley, Freddie Mercury, meu pai (que não é cantor, mas tem uma voz linda...) rs. Não é possível parar em 10!

 

 

JM - O que você acha do aborto?

 

MF - O aborto deve sempre fazer parte de uma discussão aberta. Não acho possível pensar no aborto sem pensar no caso a caso. Nunca fiz e não consigo me imaginar fazendo.

 

 

JM - Quais são os planos do Amaranto para o futuro?

 

MF - Os planos do Amaranto para um futuro próximo são a gravação de um DVD e o relançamento de nossos primeiros discos que estão esgotados.

 

 

 

 

 

Amaranto: Casa Aberta [Flávio Henrique | Chico Amaral]

  

 

março, 2012
 
 
 

 

Mais sobre o Amaranto: http://www.amaranto.com.br

 
 
 
 

Jovino Machado (Formiga-MG, 1963). Poeta. Graduado em Letras (UFMG). Publicou, entre outros, Trint'anos proust'anos (Mazza edições, 1995), Samba (Orobó Edições, 1999), Balacobaco (Orobó Edições, 2002), Fratura Exposta (Anome Livros, 2005), Meu bar, meu lar (Editora Couber Artístico, 2009) e Cor de cadáver (Anome Livros, 2009).

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