ritmo de um violinista | giacomo balla | óleo sobre tela | 75x52 cm | coleção galeria estorick |  londres | 1912

 

 

 
 
 

 

 

O Cubismo e o Futurismo são lembrados incessantemente, nos âmbitos das artes plásticas e visuais, como vanguardas fundamentais para a contínua evolução das Contemporaneidades. No Modernismo, o artista, por meio de sua linguagem, recorta a realidade e não para de questionar os vários aspectos constituintes de um novo mundo que nunca está pronto e acabado. Entre o realismo e a decoração, Matisse avança nos entendimentos da independência da cor e Cézanne expressa a liberdade pessoal na criação, desprezando os modelos do academicismo. Gauguin, ao não exagerar na fidelidade à natureza, através de cores e linhas expressivas por si mesmas, sintetiza o abandono da representação realista. Monet, no limiar das aparências, eterniza a descontinuidade temporal. Picasso inventa imagens sob múltiplos aspectos, fragmentando a paisagem. E Giacomo Balla, em ritmo e na velocidade de um violino, profusão de cores e linhas, mostra claramente o dinamismo de uma nova sociedade regida pela urbanidade industrial em prolongada expansão.

 

Os novos movimentos de representação da realidade são um conjunto de ideias e responsabilidades estéticas perante a História. Ou seja, no ritmo gestual e processo interativo, mudam-se a percepção e a construção do imaginário, sujeito às variedades de interpretações. Reflexos para o olhar imaginativo do artista, no qual está imerso também o olhar do espectador, ditando a elasticidade da fruição necessária para que o objeto plástico torne-se autônomo e universal, um enigma, lugar de pensamento de todos em contraste com suas singularidades complexas.

 

A arte não busca verdades, muito menos mentiras. São realidades imaginárias, fontes para agregar novas leituras, relações simbólicas, significados e sentidos nas correlações e reflexões dos mundos externo e interno. A arte incomoda o olhar leviano e simplificador. E irrita a acomodação à custa de explicações pré-moldadas e forçadas. A arte é um novo mundo que nunca está pronto e acabado. Está sempre em construção.

 

 

les demoiselles d'avignon | pablo picasso | óleo sobre tela | 2,44x2,34 m | MoMa | nova iorque | 1907

 

 

O tempo e o espaço, pai e mãe, como prolongamentos e unidades que lembram Janus, estão implícitos nas discussões diante das consequências da evolução da humanidade. Walter Benjamin, também Krakauer, concordavam que "a obra de arte foi sempre suscetível de reprodução", almejando um aspecto até então nunca visto. Num prolongamento atual, observa-se que, pela TV, cinema, fotografia, internet, telefonia, grafite, etc. podemos perceber e ver acontecimentos que nunca poderíamos ter visto ou percebido. Mudando consideravelmente a nossa maneira de representar e participar dos movimentos da realidade. 

 

A reprodutibilidade, renovação das estruturas e imersão de suportes em gêneros da TV, internet, vídeo, áudio, etc. (relembrando o princípio régio do Futurismo, que era a paixão pela velocidade, a tecnologia e novas máquinas. Também o fato histórico: foi o Futurismo que ao usar as formas geométricas e planos combinatórios com cores complementares — do próprio Cubismo —, colocou o Cubismo em movimento), e a profusão da cultura em seu modo fragmentário (colando, associando e angulando o imaginário, semelhante ao Cubismo) alteraram todo um modo de existência do imaginário. De tal forma, que ante as novas formas de representar os vestígios da realidade, possibilita resgatar seu valor de exposição em detrimento do seu valor de culto. Convém suplementar e destacar o pensamento do crítico Alberto Tassinari ao observar que o período moderno possui duas fases: formação e desdobramento. A primeira compreende um período inicial a partir de 1870, notadamente com as vanguardas que abdicaram dos modelos naturalistas de representação. O seu desdobramento, a segunda fase, a partir das telas de Jasper Johns (por volta de 1956), constitui a sedimentação e conceituação própria e autoral, não como negação e oposição (fato marcante na primeira fase em relação ao Realismo, e, principalmente, ao modelo Naturalismo), mas um espaço divergente, em construção, no qual o traço do artista em seu processo criativo e na obra final oscilam semelhante às colagens cubistas, girando as posições e condições da arte e o mundo, num movimento sem cessar, afetado pela hipervisibilidade, rotação contínua, expansiva, usando materiais diversos do cotidiano, muitos inusitados, para protestar contra determinadas tradições da arte dita "elevada" (eis parte do legado Dadaísta!). O mundo e a arte — além das presenças dos artistas, espectadores, curadores, galerias, museus, bienais, exposições, etc. e as máquinas com suas tecnologias —, na atualidade, estão contaminadas por novas linguagens e novos aparatos eletrônicos e digitais, que participam ativamente nos processos de mediações de ambas, a arte e o mundo.  

 

No mundo contemporâneo faz sentido também (re)pensar a estética como crítica, como propunha Benjamin. Diante da obra de arte (ou obra visual), imersos na Cultura da Imagem (ou Cultura Visual), num mundo pluralizado, a partir das várias percepções já totalmente (a não ser que exista a frequentação e observação da obra visual in loco, principalmente daquelas que não sejam produzidas diretamente no e para o computador e internet) contaminadas pelos novos meios de comunicação, demanda resgate, reinterpretação, abordagens dos processos criativos (re)conectando artista e obra, dando sinais de que a crítica opera no senso estético da ressignificação. Nesse novo contexto, a dialética nas arestas das mediações quantitativas e qualitativas passa por esse processo de ressignificação e compreensão da ruptura e revolução técnica midiática. Uma ressignificação essencial contínua de  conhecimento, dentro de um processo latente, agudo, potente, no qual a humanidade constrói novas moradas (suportes) para que a arte se perpetue.

 

 

 

Referências

 

BENJAMIN, Walter. A Obra de Arte na Época de suas Técnicas de Reprodução, in Coleção Os Pensadores (Textos Escolhidos: Habermas, Horkheimer, Benjamin, Adorno). São Paulo: Abril, 1980.

 

CHIPP, H. B. Teorias da Arte Moderna. São Paulo: Martins Fontes, 2.ed., 1996.

 

SALLES, Cecilia Almeida. Arquivos de Criação: Arte e Curadoria. Vinhedo/SP: Horizonte, 2010.  

 

TASSINARI, Alberto. O Espaço Moderno. São Paulo: Cosac & Naify, 2001.

 

 

 

 

março, 2014