©caroline hummels
 
 
 
 
 
 
 

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Pior, se Deus apressasse um beijo,

viesse aqui como lembrança.

Pior, se viesse, do fundo, uma outra verdade

submersa. Porém, todos, como nós, abafam

os casos. Se eles fossem diferentes

e, no lugar de arriscar, preferissem o pior,

mó de uma nova estrebaria, veio para rugas, greves,

congelamentos, autoramas.

Ainda, se reinventassem um dia de sol.

Deveriam supor, não a mim, nem ao poema,

mas ao desejo tácito e fiel.

Ao menos um castigo; de pano

de fundo, uma guerra de Tróia, meninas

choram, sete e oito anos. Ainda, por ciúme,

seria pouco, muito pouco querido para nos atrapalhar,

ferir-nos a memória, a calmaria da face...

Não poderia ser assim. Não deveria ser por menos,

senhoras tricotam mentiras de abonada

gente. Quem é joio, quem

é Judas, por que te beijou, preciso saber.

Naquele lugar distante

e faminto, naquela marionete

de pensamentos vãos, ainda persiste. Eis que primeiro

falece, nada não há, aquilo de que

tanto falei, por quem tanto pedi, finalmente — não chego.

 

 

 

 

 

 

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Se, das desavenças,

restasse uma flor,

peremptório gancho

dessa face cruzando

alheia a sonhos

e diretrizes; se, do peso

e da palavra bom-dia,

rogasse um pranto,

duro (...), daninho

queria dizer; decifrar

a tétrica cor de homem

manchando a camisa

colhendo as divisas

de uma dignidade

que não conheceste

que nem recebeste

e até soprara forte

no peito; sim, dessa flor

que desaba quarteirões

inteiros de rugas, natais

opressos sem mão

afago de mão pelo

filho vindouro: mal

reveste a lacuna do medo

num muro

ardente de cal.

 

 

 

 

 

 

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Boca de vinho,

dois andares

em pleno fosso:

sim — escrever

tem suas cinzas.

Boca de veneno,

nessa meia onde

se coa café, andar

de malas prontas,

coração agasalhado.

Sobra-nos a virtude

dos que fogem do empate

e aplacam, da memória,

tais bênçãos, sem oração.

 

 

 

 

 

 

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É noite. Tudo parece escondido.

Silêncio entre os carros que rodam

a madrugada. Tudo se passa

na cabeça: manhã, os trens lentos

e lotados, o olhar da mulher que amo

a solidão dos livros. Tudo assim

sob a mira do fuzil. De repente

o relógio toca: é preciso acordar

antes, porém, precisa-se dormir.

Sigo o poema para vê-lo onde termina.

Tudo está nu, debruçado na janela

feito um latido. O frio anuncia

o fastio do próximo verão. Não

por esta noite, num abraço acolhedor.

Não agora. Tudo range nessa hora:

os pelos crescem, ela vira para o lado

e dorme, ouço, entre os batimentos,

a voz do coração. Ouço calado

sem par. Haverá outro momento

para escutá-la senão o de dormir?

 

 

 

 

 

 

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Foi do outro lado do Rio que nasci.

O semblante de minha mãe

rejuvenesce com as lembranças.

 

Toda palavra é uma palavra magra

é o atroz desejo que outro te invada

sem rogo, a te roçar com a nuca.

 

Uma posta de carinho, pois

a joia do corpo sempre arderá

às vezes me pego cantando.

 

Aceita teu pai, o destino da vida

cada um é que faz, o cantarolar

do matuto convence qualquer um.

 

Basta que a vida repouse nos braços

um gato te incendeie na cama.

Não sei o que vai dar. A vida que ganha

 

 

 

 

 

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POEMA PARA QUANDO SE FAZ DEZOITO ANOS

 

 

A culpa é minha, assumo.

Hoje respondo por qualquer ato.

A morte é o sorriso agreste,

a cor do que resta. A culpa

é cada passo que enferruja o aço.

Levo em mim os talhos que os anos

encravam no peito. Sangro

pelo chão os ditos populares.

Iansã, aqui estão os teus colares.

Para todo erro, há sempre

um jeito. É o amor sem

esperança, o verso mais brega,

porém ele é meu. Eu culpo

todas as crianças, todo ritmo,

toda espera, o que foi seu.

Deixe que eu vá para a prisão,

que eu decida meu coração

a quem quer que seja.

Minha senhora, senhora santa.

Decido eu se tem ou não se tem janta.

 

 

[1993]

 

 

 

 

 

 

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Por não haver pecado é como se nascesse.

O temido arcano da morte não decifra seus mortos.

Como quem espera uma bala no crânio

não há motivo para honra ou orgulho.

 

Dorme quieto um cão vagabundo.

A lua ilumina o coração do planeta.

Ainda que se acenda a dinamite da paixão

e as cartas do mago caiam da manga

 

era como se eu tivesse medo

sem saber qual o medo do mundo.

O enfado nessas horas é sorrir.

Ponha o vinho que eu bebo até a cicuta.

 

É a hora canina do abandono.

Não fique sonhando que descansará feliz.

 

 

 

 

 

 

DUAS COISAS

 

 

É muito importante que você saiba

que precisa começar a quimio o mais rápido possível

 

e que para uma pizza pré-cozida

são dez minutos

no forno.

 

 

 

 

 

 

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No manequim detrás da vitrine

ou em algum lugar

como propaganda

de cabeleireiro.

Está também

na mãe buscando atendimento;

mesmo na tv

quando se assiste

o congresso:

são dias sem dormir

e que saudade dos pesadelos.

 

 

 

 

 

 

MIGALHA

 

 

Fiz como você pediu

cortei o poeta

em versos

e os espalhei

em um prédio abandonado

numa caixa d'água vazia

pra ninguém saber.

 

 

 

 

 

 

NIKITA

 

 

Dizia

com o picolé na mão

 

adoro

tragédias

tarados

& promessas

quando vou

às festas

de meu pai

nos

leilões

 

imagino

 

mst

invadindo

deto

nando

a festinha

dos

barões

bois premiados

agora

servem

de churrasco

no prato

das crianças.

 

"Não me

queira mal

é que eu só desejo

o pior"

 

dizia

 

enquan

to chupava

picolé saindo

da boate

ainda de manhã.

 

 

 

 

 

 

~

 

 

3s

trelas

1 mapa

aqui

começa

a meta

fís

ica

como

na pergunta

se 'e'

ou 'em'

era o

que devia

3strelas

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mos ai co de

cores

a teoria

das cores

de Goe

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não

explica

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com

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março, 2020

 

 

André Luiz Pinto da Rocha nasceu em 1975, Vila Isabel, Rio. Doutor em Filosofia pela UERJ, leciona na FAETEC e SEEDUC. Casado com Cristina Melo, pai de Tales Melo da Rocha. É autor de: Flor à margem (1999), Um brinco de cetim / Un pediente de satén (Maneco, 2003), Primeiro de Abril (Hedra, 2004), ISTO (Espectro Editorial, 2005), Ao léu (Bem-te-vi, 2007), Terno Novo (7Letras, 2012), Mas valia (Megamíni, 2016), Nós os Dinossauros (Patuá, 2016), Migalha (7Letras, 2019) e, em parceria com Armando Freitas Filho, Na rua (Galileu Edições, 2019). Seus poemas foram tratados nos documentários André Luiz Pinto: Prazer, esse sou eue Autobiografias poético-políticas, em 2019, ambos de Alberto Pucheu.

 

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