O amor estampa as revistas
"Sairei correndo,
lançarei meu
corpo à rua
Transtornado
Tornado
louco pelo
desespero".
Lílitchka!, Maiakovski
Às quatro horas da tarde. Era
setembro. E o silêncio se permitia reger somente os sons que lhe
interessasse. A menina não tirou a blusa. Sabia que a mínima visão do
seio mutilado poderia quebrar a mentira de perfeição em que estavam, até
ali, fingindo acreditar. Mais um pouco, o corpo iria esquecer o
mito e partir direto para a sensação.
Quando tudo se
misturasse e o bicho quisesse sair urgente para lamber com delicadeza a
polpa crua, a menina poderia despir-se inteira e exigir com o olhar mais
doce que o bicho arrancasse de dentro dela aquela dor. Por enquanto, o
exercício de encontrar cada mínima imperfeição e ir-se afeiçoando a
ela.
Os dois haviam se conhecido no clube secreto do amor.
Sabiam absolutamente tudo um do outro sem nunca terem se visto. Cada
marca do corpo. Cada esperança secreta. Filme preferido: O último
tango em Paris. Cena preferida: a hora em
que...
Às nove da noite. Era outubro. Fazia
um calor infernal e o barulho dos carros na rua atravessava o quarto
como se rasgasse o silêncio com uma grande navalha. O menino deixou-se à
cama de costas, apoiado aos cotovelos. A calça apertada pressionava o
bicho que já tinha se decidido que não.
E agora?
Sem jeito, mas querendo arriscar, a
menina... ela é um pouco gordinha!, tirou a blusinha e mostrou
os seios brancos de bicos bem rosados. O menino colheu-os com sua mão
quente e suada e, em seguida, passou a cara imberbe, cheirando, mordendo
e lambendo como um gato aqueles dois fartos pratos de leite com
cereja.
Apesar de o bicho ter decidido que não, levantou a
cabeça pontuda por mais de três vezes e baixou-a angustiado querendo
convencer o menino de que não deviam estar ali e que tudo não passava de
um grande equívoco. Era tudo mentira, pô!
Os dois haviam se conhecido no clube
secreto do amor. Sabiam algumas coisas interessantes um do outro. Cada
marca de roupa. Cada lugar da cidade! Filme preferido: A hora do
espanto. Cena preferida: a hora em que...
Às duas horas da tarde, o cara entrou no
estacionamento do Shopping Center, piso tal, garagem tal. Às
duas e quinze da tarde, a dona entrou no estacionamento do Shopping
Center, piso tal, ao lado da garagem tal. Às duas e vinte, o carro
do cara saiu do Shopping Center com os seus vidros escuros
fechados, ar-condicionado e som ligados:
— Ah, você sabe que eu adoro essa
música?! — a dona disse isso conferindo o bicho que já se contorcia
todo, querendo fugir do escuro e ser engolido por outro escuro.
— Gravei esse cd só pra você. —
respondeu o cara, exibindo uma cara bem tratada e dentes brancos e
fortes que poderiam estar num comercial de Sorriso, ah!!!!.
No quarto de espelhos, o trato foi que
nenhuma marca poderia ficar.
A dona virou de costas e o cara meteu o
bicho muitas vezes no escuro da caverninha.
— Puts! É meio peludo e nem é uma
caverniiinha, assim! — não se sabe se o cara ou o bicho pensou
isso, mas houve uma desolação momentânea...
— Tudo bem. Concentrar!
Concentrar! — isso, sim, foi ele que pensou.
O cara gostava de cavalo com buraco na
sela. E a dona era uma égua muito raçuda. Algo que fazia o cara sentir
toda a ferocidade do seu bicho. Aliás, a dona até parecia que tinha
trabalhado em circo. Além de domar bem o bicho com suas massagens
precisas, era uma engolidora de espadas de primeira.
— Desse jeito eu vou querer ver você
mais vezes. — disse o cara, consolando o bicho todo esfolado,
enquanto a dona se vestia.
— Ai, tá em cima da hora de pegar as
crianças no colégio, cara! Isso não tá certo! — a dona disse,
retocando o batom, depois de ter enfiado na boca três tic-tacs,
caixa azul: refrescância em menos de 2 calorias!
Os
dois haviam se conhecido no clube secreto do amor. Sabiam o suficiente
um do outro. Conta na mesma agência bancária, Viu, como não era
mentira, cara! Comida preferida: tailandesa. Raça de cães: dálmata.
Filme preferido dela: Dio come ti amo. Cena preferida:
Aquela hora em que...