"Todo
tempo quanto houver pra mim é pouco
Pra dança com meu benzinho numa
sala de reboco"
(Numa
sala de reboco – Luiz Gonzaga/José Marcolino)
Sempre
gostei das que falam demais, como se ouvissem a própria voz curasse a
impossibilidade de serem algo mais que uma rádio difusora da felicidade
alheia e da infelicidade própria. Sempre gostei das que trazem
estampadas as estrias como herança maior que suas crias lhe
deixaram.
Estou
ouvindo uma a me contar uma história sem fim, uma versão das "Mil e uma
noites" acontecida na periferia da cidade. Levanto-me para acender o
cigarro e ela se ergue do sofá. No movimento de levantar do sofá seu
short, estampado com uma torcida qualquer, revela mais uma vez suas
estrias. Tenho ímpeto de imitar o Mirisola e extrair uma a uma na ponta
do cigarro. Mas essa história é para ser engraçada e não melodramática
demais. É para ser passional. Uma passionalidade cafona e não
intelectualóide.
Nutro
esperanças que ela nunca pare de falar. Se ela pára meus ombros não
agüentam o peso do mundo. Se ela pára meu HD queima, meu relógio perde
os ponteiros, meu estômago embrulha, minha roupa limpa suja e eu volto a
ser poeta.
Preciso
desse cotidiano, dessa linguagem humana, dessa taragarelice. Preciso
desse quintal imundo, desse país que não deu certo, de olhar e vê você
bem perto a me contar histórias que jamais ousaria
escrever.
Volto
pro sofá, abro a janela, nosso bebê chora, implora colo. A visão de um
seio cheio de estrias me enternece. Peço que me fale o que ele falou e
novamente a história aparece, toma forma, condensa meu cérebro. Tusso,
vem à boca saliva amarela.
Graças
a Deus que essa história não tem fim!
