A Maiakóvski

 

 

Se fosse o amor

possível

 

Diria que tenho

um amor

 

Se fosse o beijo

possível

 

Diria que tenho

um beijo

 

Se fosse o abraço

possível

 

Diria que tenho

um abraço

 

Se fosse possível

um teclado biônico

diria que tenho

um toque incrível

 

Antes que perca

a noção do impossível

digo e repito

viver não tem cerca

 

 

 

 

 

 

Fuga

 

 

Agora, um café

e um cigarro.

 

Lá fora estiou,

o céu promete

linda noite.

 

Vem vindo

um som.

 

Estranho!

 

Brilhos, faíscas

de lucidez.

 

Prata

 

Traspassando

a consciência.

 

O século

varando

as nuvens!

 

 

 

 

 

 

*

 

Quero fazer poesia

homenageando

solidão e tarde

 

Margeando

meus compromissos

superpondo temores

imaginando.

 

O primeiro ser,

que poderia,

nomear o vento?

 

Ninguém foi

nem será jamais

primeiro.

 

No princípio

havia

no máximo,

o verbo

HAVERIA.

 

 

 

 

 

 

Profissão

 

Aquele piano

achei que seria

meu piano

tão fácil tocar

simples preto e branco

 

Sustenho

um sustenido desejo

um dó ré mi fa

um dolce far niente.

 

Carrego o piano.

 

 

 

 

 

 

Do contra

 

Como foi me acontecer

tão grande injustiça

a velhice?

Em que momento se

partiu meu elo com

o passado?

Quem foi que amarrou

minha égua no

futuro?

 

Era tão solta de mim

a infância

É tão presa a mim

a responsabilidade

Ando sonhando tanto

planejando fugas

tantas...

Sorrio por força do

hábito

esqueço por força da

dor

Vejo a morte em pranto

levando pessoas sorrindo

com a mão

Ah! Se eu pudesse

gritar

um redondo imenso

não

 

 

 

 

 

 

ALTO  MAR

 

UM  GATO  EM  METAL

NEGRO

SUSTENTA UMA VELA

VERMELHA

NO  BOJO,

SOBRE  A  PAREDE

BRANCA.

 

MAGIA  DA  INSPIRAÇÃO

CANDOMBLÉ  E  DESIGN.

 

ARRAIAL  D'AJUDA

DE  DENTRO  DO  MAR

OBSERVA

 

UM  CONTINENTE

IMPOSSÍVEL

DE  SER  DEIXADO

COMO  ESTÁ.

 

UMA  ANGÚSTIA

DE  PERDER

O  IMPOSSÍVEL.

 

O  GATO  PRETO

ESPREITA

A  ENCRUZILHADA

                   

ONDE  A  CURVA  FAZ  A  DOR.

 

 

 

 

 

 

Arte

 

 

Tecer

desfazendo

o tecido.

 

Nas feridas

sombra de

amor perdido.

O outono

amores

desfolhados:

 

em ventania,

vagas de tristeza e dor.

 

Chuvas

anunciam

o azul...

 

Corre lá

um papagaio!

 

 

 

Sambinha

 

 

Não se compara

seu  compasso e o meu

você  nem tem um transferidor

 

Haja paciência

pra você mulher

 

Hoje de lua

amanhã já é de sol                          

 

Se acaso chove no

seu guarda-sol

 

Haja paciência

para o temporal

 

Pior de tudo é que

seguro o ponto

no relógio dessa marcação

 

 

 

 

 

 

Beauvoir

 

Cavaleiros em luta,

imaginação cinzenta

pedra e sobressalto.

 

Caminhos se abrem

de encontro ao dragão

e ao brilho da espada

sem compaixão.

 

Donzela em cima do muro

quando será mulher?

 

Suspeita de crime no escuro

sem corpo, arma ou digitais

condenação quase certa

em todos os tribunais.

 

Qualquer culpa é alívio

até para o estado de graça.

 

O muro, no entanto,

sartreanamente cai.

 

 

 

 

 

 

Homo Sapiens

 

Enquanto passa o vento

também corre o tempo

nas veias do meu tambor.

 

Há um espírito

rondando todos

que espelham

dois braços

um abraço

um amor.

 

Me diga seu nome

de batismo ou suador

nos encontraremos

na Grécia

China

ou Equador.

 

Rio acima, mar a dentro

é sempre carne de barro

que desfaz e refaz o perigo

nosso amigo desde sempre.

 

 

São coisas diferentes

o andaime e o andor

são só passos

sua casa

minha cruz.

 

 

 

 

 

 

GÁS

 

 

IMAGINO UM BRASIL

AROUND THE CAMPOS

 

UM HOMEM DE PÉ

EM PÉ DUPLEX

 

UM HOMEM DE PÉ

ERECTUS

SEM PÉ NEM CABEÇA

 

HOMEM-MULHER

 

FALANDO POESIA

SONHANDO PERFEITA

FANTASIA

 

PÉ FEITO

MÃO TAMBÉM

 

HOMEM-ALEGRIA

TRANÇANDO A GRÉCIA

TRAZENDO LUSÍADAS

DANTE ERA O VERBO

 

UM LISARB

ETANO

METANO

DÍNAMO

NÃO IMAGINO

 

 

(imagem ©stephen st john)

 

Flausina Márcia (Cataguases-MG). Graduada em Ciências Econômicas pela PUC-Minas, trabalha  na Secretaria de Estado da Cultura, onde exerce as funções de Diretora de Pesquisa, Informação Cultural e Divulgação. Escreve poesia desde 1979 e, em 1985, teve  publicados vários poemas no antigo jornal Diário de Minas. Publicou seu primeiro livro, Vaga-Lume, em abril de 2002. O Suplemento Literário de Minas Gerais trouxe em sua edição de maio de 2003  o poema "Cores", de sua autoria. Em 2001, com muita satisfação, foi homenageada pela Cidade de Cataguases, nas comemorações do Dia Internacional da Mulher. Adora ser mãe da Cíntia, do Diogo, e avó do Arthur. Tem olfato e audição apuradíssimos.