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nec spe nec metu

Para Gregório de Matos & Waly Salomão,
atados sem perdão.

1ª voz

Por entre espadas, podreiras, pestilências
O humano espírito enaltece sua inhaca
Só acha quem na cacunda nos atraque
Escroto encara pupila nem pestaneja
Donde olho de cu toca um ferro irrompa
Só há quem doe dardejo, vau e varadas
Diabo desdenha, pois não há quem custe
O humano espírito invalida a sua estada

Não agüenta cutelo de mais nem um minuto
O miolo que amolece na lapada primeira
Esmola quem não rapace traquina rape
O fel somente bebe quem besta não burla
Ataque na queda, quem afrouxa fodido é
Mofa primeiro quem primeiríssimo atocha
É precavido aquele que pensa seu prego
De somente na testa do próximo cravá-lo

Dó é doença de fracotes, estúrdios e tontos
Granjeia afagos quem finge sua pantera
Se puder, destroce enquanto desuteriza
Deixe o 'ai quem dera' para os atoleimados
Não atordoe, atropele como trator um pinto!
Queira a querela só quando gigante armado
Davis são fábulas para pequeno e pobre
Lutrido é rico que logra enquanto sona

Fomente o ofídio e dê o outro à peçonha
O melhor modo para o mítico é o minto
Perdoes e serás currado feito um mofino
Adule presto feito puta, depois esmague
Chibata pro chegado, desgraça pro desafeto
Respeito espalha quem tutela a tirania
Ruma para a brancura quem o ódio dita
Há que ser soda — dolorido e discreto

De cima, puxe encatarrado ronco e cuspa
Na mucosa o mimo é a facada festança
Quem cuida de lazeira come a carniça
Crime só dana os caridosos da carne
Apedreje os perrengues poucos pisados
Perdão foi feito somente pra doar defunto
Desossado deslize na lâmina e não se lira
Couro engrossa quanto mais malandra

Dobre o juro do que vingas e lave a veia
Seque a teta não dê vez que molesto mame
Peça pra dá e não dê o seu, frua o alheio
Boceta, cu é banquete que esbalde é pouco
É certo que se cague e ande, injúria é janta
Rume para aquele equilíbrio desfronteirado
Esse nem fia nem firula é da casta o cancro
Do humano espírito é o diamante inhaca

 

Intermezzo

Onde a Bicha sua bruaca abriu?
Foi no buxo!
Foi no buxo!

O rombo que na tripa ruptura?
De tacho e meio!
Finca ferro!

No pé do banhudo buxo?
O fedentício!
Aflora! Aflora!

A crosta capacho?
Rotunda!
Chupa seu macho!

Assim, caminhadeira?
Ronca e fuça!
Ronca e fuça!

A venta viscosa?
Arfa! Arfa!
!Afoba'abafa!

 

2ª voz

Assim é pluriporca sua queixada
Molares mascando até molambo
Ringindo num grosa e gasta
Borbulha nos beiços sua escuma
Assim inunda o pastoso visgo
Melecando a papa, samba sujimundo

Assim grossura engordura ego
Lençol seboso que campeia à rédea
É siso que se corrobore — sebáceo!
Que toma a trote corpo e cosmo
Se desuso for reencenar sua sombra,
Que o borralho valha seu valimento!

A combustão mefítica do mastigado
Miasma que infla empanzinando
Fermenta em pipocos, ulula e vaza
Bodum que furdunça sua catinga
Ardência que degenera as cercanias
Mais um fio flatulasse mundo findava

Espie a matraca pelos cotovelos
Ou casmurros em celas entrunfados
Ratos ou orates é a mesma gamela
Se da tropa for parideira, piora a peia
Amancebados, mais geram a gangrena
Quem muito pare, pare calango e jia

Despirocado de tudo ando não vivo
Danado sojigo este ritmo arregaçado
Caleja e na soma não sobra um déu
Cisco e pimenta?! É sabido e certo
Lacrimeja ou cega de riso ou raiva
Com o sol do mundo o ser desassimilha

Birrento, desembesto o meu chuço
Quem engole não teme estrumar
Nem rebuces o aleijo nele infecto
Esta lábia lorpa que chia chibata
Desfeita o dono, veja lá diverso
Nem contenta a cantata nem mitiga

Cuide hoje seu encosto, pois pior será
Nem todo jarro enjeita pé-de-pica
Malcria quem nos cueiros mel lambuza
Muito mais morde se a gengiva amola
Lambança é loa pro seu desgoverno
A cumbuca que me cabe? Ancha e chã!

Carro que não freta injuria seu carreiro
Do rabicho até a venta no mundo manda
O desarranjo, o enguiço, banzo e breu
E se o tempo demo já d’antanho mostra
Seu relaxo, sua renzilha, sua frutiqueira
Na cangalha só não divulga o cego cego

Imutável é a tranqueira do sujeito em si
Estropia quanto mais tropica sua tara
Caga na cuia depois que arrota a ceia
Entesa seu desmando e assim se ceva
O humano espírito entrevado tresandeia
Num mundo armengue desmerece a laia

 

Intermezzo

Que cachorra encarca na peia?
Recebe creca na veia?
Tora! Tora!
Mais doendo demora,
Mais o vergão vadeia!

Que cão não cambaia na croa?
Não vê, não vive, nem voa?
Fode! Fode!
Mais o sarrafo sacode,
Mais o verbo esboroa!

Se o verbo fode fervor,
Tanto mais mela
Se fero esfrega,
Então o fodão fossa,
Que seja mega
Sua esparrela!

 

3ª voz

Melhor no mundo medra
Quem melhor maquina
Se no mundo curtume
A maldade é nossa mátria —
Máximo embroma,
Quem bem mascateia.
Saudade e sujesta só aqui têm
Saudade cega sujesta soma

Se mal no mundo mora
Mata e ama e imita a merda
O tempo demo demonstra:
No tórax seu tarugo aperta!
Escancha se oportuno
Escracha se der brecha
É dote bastardo o mundo herdado
Pense a pisada — na brenha o bote!

Só dom o mundo não move
Amor quem tem mesquinha
Cachimbo malacostuma o malaco
Suporte o sonho do tempo
Quem escalda sapo é sonso
De meu minha desmedida
Que ao cabo não cabe seu tamanho
Não vale o que na tripa trabalha

Mega masturba do grelo à glote
Não podendo da cola de corpo
E corpo negar cisão, engasta
Caralho íngreme Buça barroca
Sagra na gosma do derramado
Na uretra contra navega
Vibrância de varas evadindo!
Feixe de enxames que enxurra!

Que dê seu oco quem pena tem
No furico dá-lhe pisa, soque o saco
Queira o zambo quizumba!
Tanino que canalha desencatarra!
Fodendo fosforize seu impasse
Viver é vilania mais dói sem verba
Quem dera fosse a vida esse Ervário...
Tenha o verme também a vez

Bem no mundo demo medra
É quem maldoso madruga
Esperto se desespera, pasta
Desvergonha é vantagem na terrena
Ponteia, Puto! Sua canção careta
Engasga sua talagada de malafo
Exu xumbrega, mas não xibumgo
Chilra, Puto! Seu destôo pelas praias

Saudade quem tem é sorte,
Num mundo já de todo remendado
Todo metro possuído despossuído
Lasquinado onde a pica ponha
Onde dono não há, verás: é treita
O senhor repare — o dia desacerta
Bala borrasca bosta — o tempo
Terreno onde é travado nosso desdouro

Aperreado, morro no mundo
Se a arma sua mira mente
E o verbo velhaco encrespa
O discurso do que disse ou diga
Não retiro nem meia sovela
No mundo'medo sem nem!
Palavra é esperança peca
Um barrufo de borrela bate!

 

Intermezzo

Quem? Ciência...
Lambe e não cospe,
Intruja?!

Quem? Corisca...
Achada a chance,
Chacota?!

Quem? Comanda...
Sábado na sombra,
Bobeia?!

Quem? Estando...
Conspira a escrita,
Calibra!!!

 

4ª Voz

Bêbado de branco
O verbo entorna
Em butecos de quinta
Seu mijo verte
Fudião sem fauna
Desentope a tromba
Seu pêssego é preto
Vide a página
Se é vã a gorjeta
Que o pino espane!

Mão que muito escolhe
Só pega a praga
Maldade é merreca
Se amor ausencia
Nesse mundo cheio —
Profundo estômago
O movimento mudo
Do tempo cafajeste
No menor momento
Que seja seu, embioca

Vale o pingo possesso
No possante incêndio?!
Nesse mundo doma
Quem ruína instaura
Se a manhã maligna
Não exponha a moleira
Nesse mundo emburra
Quem da dor duvida
Valência de puta
Atura acocho muito

Quem põe mais que dá
No seu carote, só sobeja
De mim me desnomeio!
Desancorado de mim
Nesse mundo embrenho
Desando, não vivo
Onde me tenha, zero
Do que faças, ressuscito
Mortal anônimo mil, no
Ermo do cosmo encalacrado

Larva que trepa em teia
Sabe onde põe o pé
Por saber de si
Rabudo não bate porta
Esfomeado de mim
Na mesa do mundo
Rosno meu espetáculo
Memória que some
Verso de somar e sumir
Amarelo é a cor do tempo

De meu no mundo
Este crime, em si asilado
Malino minhas mortes
Engendro agouros
Minhas manhãs desfuturo
Se blasfemo e bufo
É que do toque na pelota
Pespega-se o craque
Desmando em mim
O que me desastra

A miudeza do engenho
Me desperta a fadiga
Em mim demoram
O escombro e o lume
O sítio que soletro:
Cada qual seu cu
O poema do mundo
Aloja o desengano
No terreiro do presente
Amanha esquecimento

No mundo chumbo
Ser é som sem sustância
E na palma do mundo
Minha música desmantela
Do ferrão íntimo é
Quem adoça culhão
Amigo é vidraça
Se descuida corta
Pro bicho seu rabo cheira
Sua finesse é feder

Nos descaminhos do mundo
A encrenca convoco
Quem com demônio dorme
Do inferno é inquilino
Que fera que nos fodeu?
Fui eu! Fui eu! Fui eu!
Na cumeeira do cosmo
O humano espírito caga
Quem de si faz festa
O cu logo lhe queima

Sua virulência não voga
É rabisco, é lambisco
O angu do canguinha
Só sustém saco vazio
Valente é o tempo
Que avisa, vem e vaia
Despirocado de mim
Desando, não vivo
Nesse mundo quebrado
Até Satanás soluça.

 


todo poeta brasileiro é um complexado e mastiga-rói seus fígados-poemas pelo medo-cagalhão de que seus poemas paridos tragam na testa ferrados o defuntório já sacramentado

todo poeta brasileiro é um noiado e prenhe de seus poemas pensam que irão desovar a definitiva insígnia da linguagem penam-suam-explodem e se
desesperam ao perceberem que o definitivo é
impossuível

todo poeta brasileiro quer o espelhamento de seus poemas entre seus pares e tratam essa intangível (a língua)
como a culminância
de seus pesares sejam eles do espírito da carne do cosmo

todo poeta brasileiro se orgulha (maldisfarçando) de suas citações eruditas com um quê de desimportância pra realçar com certo respeito o uso do intelecto entre seus pares

todo poeta brasileiro maldiz o ter nascido brasileiro e que sua refinada sensibilidade poética é toldada pelo idioma pátrio pois que em idiomas globalizados alcançariam povos compatíveis com sua refinada sensibilidade

todo poeta brasileiro crê que possui como único prêmio seu idioma pátrio pois a cada dia percebem o quão é ilimitado de possibilidades e que o faz ser único porisso caninos nunca o abandonam

todo poeta brasileiro crê-se um dotado-defensor da tradição não só do idioma pátrio mas de toda a tradição
todo poeta brasileiro crê-se um transgressor-travelling com o espírito doentio de sua época
todo poeta brasileiro crê-se um xamã atemporal da oralidade e que possuem a palavra curável

todo poeta brasileiro crê-se inadimplente com o real e se poema é para se tornar ainda mais devedor, irrita-se que o real brasileiro não gosta de poeta brasileiro que o estraga
todo poeta brasileiro ignora com seu espírito inabalável o real brasileiro que não o atinge
todo poeta brasileiro sofre terríveis pesadelos com o real brasileiro e crê rançosamente que poema-lo é ajuda-lo a erguer-se
todo poeta brasileiro deplora-despreza as instituições falidas e irredutíveis que congregam os incensados
todo poeta brasileiro discreto ou não bajula seu nicho nessas instituições falidas e irredutíveis

todo poeta brasileiro (unânimes) despreza-deplora o deus-mercado em troca de sua fatia

todo poeta brasileiro crê que sua memória, sua vivência, ainda precisam ser poemadas e enriquecerão a poesia brasileira

todo poeta brasileiro crê que sua visualidade-plasticidade-densidade-concisão nada devem ao visual-plástico-denso-conciso-crítico-predecessor e se o acham não o dizem e se o dizem, se dizem isentos
todo poeta brasileiro crê-se portador
de todas as sujidades,
de todas as estranhezas,
de todas as purificações-estilizações canônicas,
de toda arcanidade,
de toda ancestralidade,
de toda cotidianice,
de todos os resquícios, riquezas, miudezas ainda não lobrigados do Ocidente e do Oriente
todo poeta brasileiro maldisfarça seu ego inflado e crê que a nascença-estupro do Brasil e sua alta voltagem de miscigenação é um atraso e que seus poemas nada possuem nem devem possuir nada dessa nascença-estupro

todo poeta brasileiro se crê mito e desmito e fruto da miscigenação violentíssima da terra em que foi gerado e que seus poemas são o panorama-mosaico hiper-identificados desse estupro-nascença

todo poeta brasileiro fela-se em grupo para se auto-preservarem
todo poeta brasileiro crê-se detentor de uma singular individualidade só compatível com individualidades singulares do passado

todo poeta brasileiro crê que as suas são as mais radicais verdades, imbuído de pseudo-contundência metralha todo poeta brasileiro

Bom Jesus da Lapa — Bahia
Doze de Abril de Dois Mil e Três.


.......... Minhas más intenções na "Cantata...":
.......... Sonhei a antiga concisão e densidade latina, melhor que se diga — somente a estrutura plástica. Acasalar idéia/imagem/significado/grafia num desnorteante kinema lingüístico. Procurei deixar o ritmo desenvolver seu curso dentro do que eu desejava: a verrina impiedosa numa construção apoiada no substantivo, invertendo, satirizando ditos, contra contribuindo com algumas degenerações frasais. Chovo no molhado, eu sei. Corri e corro o imenso risco de soar maneirista demais, uma vez que tento dar significações diversas a tantos termos, uns explorando a gíria de nossa época, outros mais arcaicos que variam conforme a região. E do ritmo, como deixo claro na 2ª Voz, eu fui sou serei feitor. Para este poeta-perrengue vale a máxima de Dylan Thomas traduzida por Ivan Junqueira — "Para mim, o 'impulso' poético ou a 'inspiração' é apenas a súbita, e geralmente física, chegada da energia para a perícia e o senso estrutural do artesão". Nada define tão bem o que penso de ritmo ou faina poética. No meu ritmo manda ele, mais ninguém. Minha escola é meu ritmo, o que ele tocar eu traço. Assim tudo que escrevo, até notinhas saphadas como esta.
.......... Atei intencionalmente Gregório e Waly por não perdoar nem mesmo a própria pena, quanto mais! Poetas que cada qual em sua época foram excelentes no trato com a palavra portuguesa, mas na vida pública uns escrotos! (Taí um termo tão manjado hoje em dia onde a conotação atualmente dada não poderia ser mais apropriada — pois é o homem em seu ápice maligno), um exerceu e o outro se formou advogado, nada mais justo que as papas de minha língua não se deixem equivocar e, pra tornar as coisas mais difíceis, eu generalizo em várias escalas: do milionário ao mendigo, do analfabeto ao erudito, do sabido ao néscio, etc. Não incluí nesse atado o Glauco Mattoso e o Sebastião Nunes por serem eles raríssimos não-escrotos. Começo a crer que é por’isso que os dois são tão extremamente solitários no cenário da poesia brasílica, e não por suas criações tão deliciosamente contrárias. Percebe-se de que falo de boquirrotos necessários.
.......... Enxergar o desconcerto eu enxergo, mestre Camões, o vazio, o negativismo, a destruição gratuita de tudo e todos, porém no meu caso a inadaptação/indagação é a afronta, o olho por olho, toma lá dá cá. Tenho 300 anos de Porta de Igreja e Cuia Estendida, tenho 300 anos de Romaria escorrendo das costelas. E se é a coruja quem gaba seu toco...
.......... No pórtico a coisa é clara: sem esperança nem medo. Num mundo já de todo remendado (não esqueçam que o remendo é feito da sobra, isto é, do cascabulho), onde há todos e nenhum deus, o próprio termo é meio arriscoso graphar; todos os conceitos se inverteram — vício/virtude, valor/verdade, etc, etc, são o quê? E hoje no ano três do século XXI o desconcerto tem uns agravamentos foderosos, como superpopulação, megacidades, territórios/habitat danificados demais, e no meio disso, tudo invertido: guerra é paz, veludo é tecno, etc. Sabemos ser esta uma visão catastrófica/apocalíptica e que de novo chovo no molhado, mas a coisa é séria. Dê-me licença para este dadozinho dodói: em 100 anos desconcertamos muito mais do que o devido. Matamos dois pês: Pensar e Espírito.
.......... Nunca cri em informação sem transformação; interferir no mundo é mais que preciso, é vital, agora somente em causa própria fica muito monótono e... Vai-me falar em ética, ai, ai.
.......... É entendível que a história humana é construída enquanto erramos, mas o que fazemos com nosso conhecimento tecnológico atual é bizarro. Mas o bizarro hoje e sempre não foi e é o must?!
.......... No primeiro intermezzo foi-me impossível não apelar pra grosseria maldosa com o defunto ainda fresco — Waly; que faleceu com um câncer no estômago neste mês de maio. Dessa "glosa gastronômica" dei seguimento à 2ª Voz.
.......... O recurso utilizado no segundo intermezzo é quase o mesmo, só mudei a "glosa" de cunho erótico pornográfico. Uma constatação: o verso — "Que cão/ não cambaia/ na croa?" é um dito embutido que é o mesmo que "quem nesse mundo não chora?"; croa é uma redução achada também em Guimarães Rosa, que é a síncope de coroa, restinga que aparece em rios no estio. Daí que posso florear sem pejo, pois o terreno da coroa é arenoso, desfaz-se com facilidade, enganoso; o mundo não é tal qual?!
.......... Na "Cantata..." onde quer que o possível paciente leitor se apóie ela falseia, na pontuação/sinalização/respirações. Cada possível paciente leitor que perceba/ache/associe o seu falseio. Mesmo assim eu solto minha despontuação, e algumas entonações eu dou o que creio que seja o meu tom mais torto. Como não poderia deixar de ser a "Cantata..." preza uma polifonia, algaravia tendenciosa ao círculo. Nada que algum outro bardo besta já não tenha burilado em remotas eras. Aduzi que o desbunde debilóide em cacoetes poéticos-sonoros típicos da atual época era imprescindível.
.......... Se o possível e paciente leitor veio ao termo desse texto é bom que se diga, dá-me nojo notas explicativas. E esta é mais uma nota que mostra outra de nossas crises: a rasura.

......Étimos estranhos em ordem de chegada:

Lutrido – pessoa muito ousada.
Caminhadeira – é um sarcástico e sutil termo que os ribeirinhos do São Francisco dão para diarréia.
Preferi a grafia "mulambo".
Furdunço – é escarcéu, confusão.
Entrunfado – pessoa casmurra.
Desassimilha – Uma síncope do dito "dois sentidos não se assimilam" que varia na sintaxe popular como "dois sentidos não assam milho" daí degenerou "desassimilha".
Encarcar – é currar.
Creca – é sujeira ou doença.
Furico – ânus.
Malafo – é aguardente de cana.
Xumbrega – aí no sentido de inutilidade.
Fudião – é fodedor.
Merreca – é dinheiro pouco, mixaria.
Carote – vasilhame para água.
Malino – aí no sentido de toque.
Canguinha – é sovina.


 

Bom Jesus da Lapa – Bahia,
A vinte e três de maio de dois mil e três.

 

 

João Filho, poeta, escritor, vive em Bom Jesus da Lapa, Bahia, onde nasceu, em 1975. Publicou Encarniçado ou anotações dum comedor de cânhamo (São Paulo: Baleia, 2004). Escreve o Hypperghettos. Mais aqui.