Preconizada por Virginia Woolf, na década de 1930 [Virginia, irônica e realista, em conferência para jovens universitárias inglesas no Giron College, estabelecia as condições mínimas para que as mulheres atravessassem a fronteira física e psíquica da criação literária, ao declarar: "tendo um quarto para si e renda própria" — ditames abrigados no livro A Room of One’s Own (Um quarto todo seu)], defendida pelas feministas européias de 1970, uma "escrita feminina" ganhou corpo (e forma) na literatura, sim senhor — queira-se ou não. Mulheres escritoras (ficcionais e não-ficcionais) têm voz própria, estilo próprio, linguagem própria, temática própria, longe de "simplesmente reproduzirem modelos falocêntricos, caracterizados por racionalismos e pragmatismos", como acentua a ensaísta Luce Irigaray.

A contrapartida, segundo ela, é uma "subjetividade feminina, marcada por uma escrita mais sensorial e sensível, mais poética, lírica mesmo, uma escritura com o corpo e a alma, maior liberdade de escrita".

Apesar das (para alguns, incontornáveis) dificuldades para a definição precisa do que seja uma escrita feminina, eu particularmente entendo existir uma 'literatura feminina' com elementos, valores e vetores próprios — que só fazem acrescentar e enriquecer a Literatura (e a Cultura, em geral). Fácil identificar entre escritoras brasileiras e estrangeiras contemporâneas uma escrita nitidamente feminina — com suas obras carregadas de suas características específicas.


Existe uma voz especificamente feminina?

"Femininos, sim, são os textos que apresentem determinadas marcas, que percorrem o campo semântico de falta, silêncio, indizível, confessional, subjetivo, íntimo, prevalência do eu-narrador, visão interior, esgarçamento do sentido da palavra e da ordem do discurso, dilaceramento da escrita, busca da identidade, descontínuo, atópico, atemporal, extático, etc...", sentencia a ensaísta Vera Queiroz.

Segundo Luiza Lobo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em "A literatura feminina na América Latina", in Revista Brasil de Literatura (online), 1999, "(...) o cânone da literatura de autoria feminina se modificará muito se a mulher retratar vivências resultantes não de reclusão ou repressão, mas sim a partir de uma vida de sua livre escolha, com uma temática, por exemplo, que se afaste das atividades tradicionalmente consideradas 'domésticas' e 'femininas' e ainda de outros estereótipos do 'feminino' herdados pela história, voltando-se para outros assuntos habitualmente não associados à mulher até hoje".
 
Para Luiza, "o termo 'feminino' vem sendo associado a um ponto de vista e uma temática retrógrados, o termo 'feminista', de cunho político mais amplo, em geral é visto de forma reducionista, só no plano das ciências sociais. Entretanto, deveria ser aplicado a uma perspectiva de mudança no campo da literatura. A acepção de literatura 'feminista' vem carregada de conotações políticas e sociológicas, sendo em geral associada à luta pelo trabalho, pelo direito de agremiação, às conquistas de uma legislação igualitária ao homem no que diz respeito a direitos, deveres, trabalho, casamento, filhos etc".

"Sempre fomos o que os homens disseram que nós éramos. Agora somos nós que vamos dizer o que somos". Na afirmação de uma personagem de As meninas (1975), de Lygia Fagundes Teles, parece estar a raiz do fenômeno de transformação vivenciado pela mulher desde o século passado. Qual seria afinal uma "linguagem feminina" na arte e como é  um discurso essencialmente  'feminino'?

Nelly Novaes Coelho — uma das pesquisadoras mais produtivas do país, autora do Dicionário crítico de escritoras brasileiras, meticuloso registro  da produção literária feminina brasileira de ontem e de hoje, e de A literatura feminina no Brasil contemporâneo — alerta para o fato de que toda criação literária está condicionada à cultura na qual se encontra imersa: daí, derivam certas peculiaridades na criação literária de um e de outro, e nessa perspectiva pode-se então falar em "literatura feminina" e em "literatura masculina". Nelly, ao abordar a questão de haver ou não uma 'escrita feminina' distinta da 'escrita masculina', observa que a linha francesa, liderada por Hélène Cixous, chama a atenção para a peculiaridade de escrita feminina, a 'écriture féminine' — um conceito que estabelece a diferença feminina na língua e no texto, possibilitando uma maneira de se discutir os escritos que reafirmam o valor do feminino; "mas tecnicamente", explica Nelly, "não se poderia falar em literatura 'feminista' antes que o termo fosse cunhado, na década de 1960 — como uma espécie de respiração, de sopro vital, de silêncios densos, algo meio mágico que diferenciaria a voz da mulher. Realmente isso existe. É realmente uma espécie de magia vocabular, inerente às grandes criações, a magia da palavra poética autêntica, mesmo quando escrita em prosa". 

Sem dúvida alguma, a literatura de autoria feminina já criou seu espaço próprio dentro do amplo universo literário mundial. Desde fins do século XIX e principalmente no século XX, a principal transformação pela qual passou a literatura de autoria feminina é a conscientização da escritora quanto a sua liberdade e autonomia e a possibilidade de trabalhar e criar sua independência financeira. "Ocorreu, assim, a mudança da condição 'feminina' para a condição 'feminista'", sustenta a ensaísta Níncia Borges Teixeira.

Na verdade, as grandes mudanças que o século XX trouxe para a vida da mulher foram fator determinante para o surgimento e expansão de uma literatura feminina — reflexo e  manifestação dos novos papéis  da mulher na sociedade e no mundo. A gestação dessa 'nova mulher' deu-se pelo amadurecimento crescente de sua consciência crítica, que determinou uma transformação radical da escrita realizada pela mulher: de uma literatura lírica-sentimental, de 'contemplação emotiva', para uma literatura ética-existencial, de 'ação ética-passional' — um caminho trilhado, e nitidamente percebido no meio exterior (por críticos, leitores, editores, agentes, midia, etc.), na área da  prosa ficcional, da poesia e do teatro. 

Na nova ficção feminina, o amor — condimentado pelo erotismo, por vezes exacerbado — deixa de ser o tema absoluto para ceder espaço a sondagens existenciais, ao ludismo e ao feérico na invenção literária, ao questionamento político e filosófico. Tudo isso traduzido e materializado em experiências formais e estilísticas: fragmentação narrativa, intertextualidade, o foco narrativo múltiplo, o intenso fluxo-de-consciência, o registro labiríntico no lugar da estrutura linear, a exploração dos mitos, do esotérico, a clara opção a pela 'linguagem do corpo', "a procura do sentido das coisas" — esta talvez, a expressão-chave da escrita feminina contemporânea.


Uma escrita brasileira, sim

Muitos constataram — e comprovaram — a influência negativa da literatura em relação à posição da mulher na sociedade, "os literatos, romancistas e poetas explorando a concuspicência, a imoralidade e a luxúria que chamam amor; e naturalmente como nas relações entre senhor e escrava só pode haver obscenidade, os homens de talento produziram montanhas de livros onde a patologia mundana do amor é rebuscada ao mais íntimo e profundo limite". Com o tempo e a evoluçâo dos conceitos sociais, almejada uma efetiva mudança na sociedade, tornou-se imperativo repensar a condição feminina, enxergando a mulher, não como um complemento da família, mas como importante agente de mudanças pela função que exerce na sociedade.

No Brasil, o surgimento de mulheres escritoras ocorre principalmente a partir do século XIX, no contexto da crescente importância da imprensa e do início de movimentos em prol dos direitos das mulheres. Quando as questões relativas à emancipação feminina começaram a aparecer na imprensa, as mulheres se organizavam associativamente e passaram a reivindicar maior participação na sociedade em mudança. Ocorreram então os primeiros movimentos organizados, tendo como principal objetivo a melhoria das condições de vida da mulher — desde que orientada pela ótica masculina. [Afinal, na constituição da família brasileira sempre imperou o pater familias, ou seja, o poder  nas mãos do homem, responsável não só por seus escravos e agregados, como também por sua mulher, filhos e netos — a família patriarcal como a célula mais importante da formação da sociedade; este poder social do homem advinha do direito consuetudinário e as próprias leis brasileiras asseguravam-lhe autoridade: os direitos civis no Brasil, basicamente, até 1890, eram uma extensão dos de Portugal, isto é, eram regidos pelas Ordenações Filipinas — o primeiro Código Civil Brasileiro só vigorou a partir de 1917. Na família monogâmica, criada para preservar o poderio econômico dentro de um mesmo grupo sangüíneo, exigia-se que a sexualidade feminina fosse rigorosamente controlada, pois era a única forma de que o homem dispunha para assegurar a paternidade e a herança familiar.]

O que não impediu, porem, a formação de uma linhagem de mulheres militantes dentro da literatura (como personagens ou como autoras) e da sociedade (na militância política, por meio, sobretudo, do veículo jornalístico) que desenvolveram trabalho emancipatório preparador das condições que propiciariam, no século XX, a implementação e solidificação de um movimento que se poderia chamar de estética feminista.

Na literatura brasileira, considera-se o romance Úrsula (1859), da maranhense Maria Firmina dos Reis, a primeira narrativa de autoria feminina. O romance reduplica os valores patriarcais, construindo um universo onde a donzela frágil e desvalida é disputada pelo bom mocinho e pelo vilão da história. Contrariando os finais felizes, a narrativa termina com a morte da protagonista, vítima da sanha do cruel perseguidor. No entanto, de modo geral, a  escrita praticada por mulheres esteve ausente dos anos decisivos para a formação da literatura brasileira durante o século XIX , na vigência do Romantismo . Se não totalmente ausente do mercado, restrita a colaborações em periódicos de vida curta ou de público definido pela circulação no espaço doméstico (o que, de resto, significa em meados dos 1800 uma confirmação antecessora à interpretação de Virgina Woolf, da década de 1930).

As primeiras manifestações de escrita feminina levadas oficial e intensamente ao público externo vieram no final do século XIX, já na 'vigência' do Realismo na literatura brasileira [Paradoxal? seria o Romantismo 'mais apropriado' para a expressão da écriture féminine?]

Loas, todas as loas, portanto, para as pioneiríssimas Rita Joana de Souza, Ângela do Amaral Rangel, Barbara Heliodora, Maria Josefa Barreto, Beatriz Francisca de Assis Brandão, Maria Clemência Silveira, Delfina Benigna da Cunha, Ildefonsa Laura Cesar, Ana Euridice de Barandas, Nisia Floresta, Violante de Bivar e Velasco, Clarinda da Costa Siqueira, Joana Paula de Noronha, Ana Luisa de Azevedo Castro, Maria Firmina dos Reis, Adelia Fonseca, Maria Benedita de Oliveira Barbosa (Zaira Americana), Maria Angélica Ribeiro, Isabel Gondim, Maria do Carmo de Melo Rego, Rita Barém de Melo, Joaquina Meneses de Lacerda, Ana Ribeiro, Julia da Costa, Amália Figueiroa, Luciana de Abreu, Serafina Rosa Pontes, Adelina Vieira, Josefina Álvares de Azevedo, Carmem Dolores, Narcisa Amália, Gabriela de Andrada, Maria Benedita Bormann, Inês Sabino, Anália Franco, Delminda Silveira, Adelaide de Castro Guimarães, Honorata  Carneiro de Mendonça, Carmen Freire, Emilia Freitas, Vitalina de Camargo Queirós, Ana Facó, Francisca Izidora da Rocha, Maria Carolina Corcoroca de Souza, Ana Autran, Corina Coaraci, Luísa Leonardo, Alexandrina Couto dos Santos, Ana Aurora do Amaral Lisboa, Revocata Heliosa de Melo, Anna Alexandrina Cavalcanti de Albuquerque.
 
Até entrarmos o século XX com Júlia Lopes de Almeida, chegar a Gilka Machado e Maria Lacerda de Moura.
 
Contemporaneamente, a escrita feminina brasileira encontra expoentes, entre outras, em: Clarice Lispector, Cecilia Meireles, Maria Alice Barroso, Rachel de Queiroz, Lygia Fagundes Teles, Nélida Piñon, Sonia Coutinho, Ana Cristina César ,Hilda Hist, Adélia Prado, Lya Luft,Zelia Gattai, Ana Miranda, Marina Colasanti, Lygia Bojunga Nunes, Nilma Gonçalves Lacerda, Maria Adelaide Amaral, Luzilá Gonçalves Ferreira, Myriam Campelo. E entre as mais novas, Heloisa Seixas, Patricia Melo, Fernanda Young; e nas novissimas, Carmen Oliveira, Adriana Lisboa, Maria Conceição Góes, Clarah Averbuck, Cíntia Moscovich, Leticia Wierzchowski.

O ensaísmo abriga Flora Sussekind, Heloisa Buarque de Holanda, Leyla Perrone-Moisés, Walnice Nogueira Galvão, Lucia Abreu, Regina Zilbermann, Nelly Novaes Coelho, Marisa Lajolo, Marilena Chuaí, Marilene Felinto, Eliane Vasconcelos, Beatriz Resende.
   

Os homens e as mulheres

Naquele século XIX e na primeira quadra do século XX, no entanto, não foram apenas elas que escreveram 'sobre elas ou para elas': quatro escritores-homens se destacaram por voltar-se, em graus e enfoques diferentes, para a mulher: Joaquim Manuel de Macedo descreveu-a e tratou-a como "donzela de irrepreensíveis pendores", em especial, em A Moreninha e em inúmeros contos. José de Alencar traçou o mais completo retrato da mulher 'urbana' da corte, no Brasil pós-Independência, no auge do romantismo, notadamente na trilogia Senhora, Diva e Lucíola, além de nas novelas Cinco minutos e A viuvinha, e nos romances A pata da gazela, Sonhos d'ouro, Encarnação. Lima Barreto debruçou-se como ninguém sobre a mulher 'republicana': primeiro na década de 1910, ao desenvolver o "tema de Carmen", uma série de artigos e crônicas em jornais e revistas nas quais a propósito de crimes ou julgamentos, ataca os homens "que se atribuem direitos sobre a vida das mulheres", denunciando crimes de uxoricídio, nos quais homens matavam "mulheres infiéis" — e, pior, eram absolvidos nos julgamentos por "legítima defesa da honra" — e ao longo de toda sua produção croniquesca em jornais e revistas, tratar de questões como movimento feminino, voto feminino, direitos femininos.

Na verdade, Lima Barreto, que nunca silenciou sobre seu tempo, não poderia mesmo  ficar alheio à situação da mulher na realidade social brasileira do início do século XX, época de tantas e profundas transformações na sociedade. Retratou e a fez personagem em contos e romances, escreveu sobre a mulher em artigos e crônicas, publicadas em jornais e revistas — sob um  caráter de ambigüidade, ora criticando-a, por vezes atacando-a, ora defendendo-a, muitas vezes enaltecendo-a: diz-se "antifeminista", põe-se abertamente contra os movimentos feministas, mas defende a necessidade de instrução para a mulher; repele o ingresso da mulher no serviço público ("...rendosos cargos para as mulheres das classes sociais mais favorecidas: e as reivindicações das operárias?..."), mas defende o divórcio; imbuído da moral do seu tempo, retrata a mulher pela ótica comum. Lima destila sua típica  ironia crítica sobre a mulher (até porque a força ficcional e não-ficcional de Lima deve-se em grande parte à sua verve satírica e crítica social), mas denuncia sua "absurda" situação de dependência aos homens. Longe, muito longe da falsa, equivocada acusação de  misoginia, posicionado na realidade contra o movimento feminista brasileiro — o que ele denominava "feminismo bastardo, burocrata" — não contra as mulheres, e sim como ojeriza aos signos do progresso republicano, Lima Barreto sempre dá à mulher espaço significativo em sua obra ficcional e não-ficcional: nos romances, contos, artigos e crônicas, apontamentos e notas, comenta a situação da mulher perante o casamento; a viuvez; as oportunidades educacionais e profissionais; a moral que lhe é imposta pelo duplo valor; a desigualdade de julgamento do adultério masculino e do feminino; o mundo da prostituição e o início do movimento feminista no Brasil — e, sobretudo, defende intransigentemente a mulher "que são como todos nós, sujeitas, às influências várias que fazem flutuar as suas inclinações, as suas amizades, os seus gostos, os seus amores". Uma ambigüidade implícita e explícita em seus artigos não permeia o retrato da mulher elaborado em seus romances, novelas e contos, em que elas têm sempre atitude e comportamento progressista, são superiores aos maridos (exemplos de Olga e Edgarda em Triste fim de Policarpo Quaresma; Clara e Castorina em Clara dos Anjos; Efigênia em O cemitério dos vivos; Cecília de Diário íntimo, Cló, Adélia, Lívia em Histórias e sonhos; muitas outras em contos, etc.).
                  
Porém, nenhum escritor brasileiro do período "edificou" tanto a mulher como
personagem capital e leitmotiv básico de seus textos como Machado de Assis. Ele  escrevia sobre mulheres e para mulheres. Amores e frustações femininos eram temas constantes, sempre presentes o ciúme, o adultério, a prostituição, e as personagens femininas ocupam lugar privilegiado, lugar de destaque em todos os romances e na maioria dos contos. E mais: Machado sempre escreveu para periódicos, cujo público era predominantemente feminino, primeiro no "Jornal das Famílias", depois em "A Estação".

Nas entrelinhas de seus contos, romances, e também de suas crônicas, Machado sempre chamou atenção para as necessidades e os direitos da vida afetivo-sexual de suas leitoras: argumentava que a mulher devia receber instrução e não ficar confinada à vida doméstica, tendo direito ao amor e à liberdade — daí, seus temas mais constantes: o ciúme e o adultério. Machado trouxe à luz a questão da sexualidade feminina, a exemplo de Flaubert, Balzac, Eça, e mais tarde, Freud. [Aliás, como Roberto Schwarz diz, "Machado é um autor que em 1880 está dizendo coisas que Freud diria 25 anos depois" — nos romances, principalmente da 'segunda fase', Machado capta de forma aguda, a la Freud, as sutilezas do 'discurso do desejo inconsciente',  descreve conflitos e enfatiza o inconsciente, sua obra como o principal elemento/vetor de pontos de interseção entre a literatura e a psicanálise; a percepção acentuada do funcionamento do psiquismo humano, na verdade, vem desde as primeiras obras.]

Na maioria dos romances, a mulher é o elemento forte, põe o homem dependente, é também o esteio, a base da relação. Há matriarcas que dominam e comandam propriedades e a família, a figura masculina sendo até desnecessária; é comum no romance machadiano, que retrata a sociedade de seu tempo, mulheres fortes, viúvas que não mais se casam, como em Iaiá Garcia, Dom Casmurro, Casa Velha, Memorial de Aires. Em toda sua obra, Machado enfatizou o personagem feminino: mesmo em sua primeira fase, Livia, Guiomar, Helena, Iaiá Garcia, Lalau já dominavam; na segunda fase, as mulheres — Marcela, Virgília, Sofia, Capitu, Fidélia, Carmo — são personagens de grande densidade psicológica.

Um número surpreendente de contos são o que pode ser catalogado como '‘estudos sobre a mulher': "Queda que as mulheres têm para os tolos", "Singular ocorrência", "Capítulo dos chapéus", "Primas de Sapucaia", "Uma senhora", "Trina e una",  "Noite de almirante", "A senhora do Galvão", "Missa do galo", "D. Paula", encenam vários tipos femininos e situações com as quais as mulheres se defrontam na vida comum. Em todos, estão presentes os elementos básicos: ciúme, adultério, e prostituição. Para muitos estudiosos, Machado era mesmo 'feminista’' — e a cada leitura de seus contos, romances e crônicas, nos damos conta da sutileza e da abrangência desse feminismo.

 

março/2006

 

Mauro Rosso. Pesquisador de literatura brasileira, ensaísta e escritor, autor de São Paulo 450 anos: a cidade literária, organizador da coletânea Lá no sertão...: contos regionais brasileiros; Cinco minutos/A Viuvinha, de José de Alencar: edição comentada (a publicar); Trilogia Lima Barreto: Lima Barreto e o futebol, Lima Barreto e a mulher, Lima Barreto e a política (em preparo). Prepara ainda uma edição comentada de Contos femininos de Machado de Assis.