deu um salto maior do que suas pernas
o garoto está com os joelhos tremendo

ele ouviu muitos gritos na sala
não eram os seus sonhos sobrevoando

os olhos vagam pelo céu de cinza
há um futuro, mas tarefas estão esperando

apontou para seu colega, leu um livro
está claro que há algo se escondendo

como este cachorro entre as grades
é melhor ficar quieto do que chorando

nuvens de gente, ventos de esperança
árvores crescem e os brinquedos vão quebrando

quis contar ao garoto umas histórias alegres
mas ele está com os joelhos doendo


   

sempre no precipício é a beira do meu sonho
com o céu coberto em pó dourado

mas quanta luta, quanto sangue derramado
quantas penumbras envolveram nossos golpes

o destino pensou em trançar seus fios
mas chegou a hora de romper o último fio

ele merece a prova da sua fraqueza
ele não é o senhor dos nossos fatos

puxe-me pela mão, é o que me basta
chegou a hora da luta aflita

você agora vai junto comigo
no salto que meu sonho precipita



 

minha guerreira voltou dos bálcãs
estalando seus olhos verdes
do fundo de um caminhão baú

minha guerreira voltou dos bálcãs
injetando sangue sob a pele
de jogadora de basquetebol

voaram tijolos nos cabelos desgrenhados
ruivos como o esmalte das unhas
descendo pelas pernas musculosas

um templo essa guerreira valorosa
escapando de uma luta entrando noutra
morrendo de desejos e risadas roucas






 © defocused

 

 
deixe que corra sobre sua pele
essa gota de sêmen hesitante
meus olhos voltados para o céu
os seus ainda gemem um instante
não descobrimos nada mais do que somos
ao perguntarmos sobre algo adiante
de nós, tão fracos entre todas
essas orações suplicantes
buscando um tempo que seja outro
não o desse beijo vacilante

deixe que escorra o líquido quente
ainda trêmulo de tanto entusiasmo
almofadas voando nas alturas
interrompem os pássaros assustados
vagando ao redor do mundo
serei mais tímido ao seu lado
e o mundo será este centímetro
em cuja luz caiu meu dedo pasmo
palmilhando um tempo que fosse outro
mais que essa gota em seu ocaso




falou do terremoto que abriu
a brecha na face da terra

e lá no fundo do precipício
buscando o mundo perdido

mais no fundo dessa espera
do perigo do amor, que é morte

entramos animais desesperados
e o céu desapareceu enciumado

a primeira mulher, a segunda, sorriso
que desvanece ao perder o caminho

falou do terremoto, da tempestade
que dá vida ao que é inerte

e logo já estava implorando a luz
depois do gozo que não satisfez

ejaculou e mergulhou no vazio
não há resposta para esta pergunta

mais no fundo está o mundo
perdido num corpo sujo

 

 

Mauro Faccioni Filho, nascido em Maringá, PR, em 1962, publicou os livros de poemas Helenos (1998) e Duplo Dublê (2002), ambos pela Editora Letras Contemporâneas. Dirigiu e produziu os filmes Bruxas (1989) e Loba (1987). Tem publicados diversos artigos e palestras em congressos e revistas nacionais e internacionais. Foi um dos fundadores da revista de poesia Babel.