Obscuro: tudo que dá trabalho entender, ou que não tenha sido feito para determinado tipo de entendimento no qual insistimos.
Obtuso: um ângulo maior do que o reto, isto é, maior do que 90 graus; diz-se daqueles que põem sua mente numa posição de raciocínio arrevezada.
Óbvio: deve vir acompanhado de "ululante", pois o óbvio é um bicho que ulula.
Olhar: pesadíssimo jargão de crítica literária e de arte, e palavreado de culturetes. Uso: "Um olhar sobre São Paulo"; "Libertando o olhar"; "Olhar artístico"; "Olhares"; "Narrativas do Olhar", etc. Quando empregamos a palavra "olhar" nesse sentido parecemos subitamente inspirados, viramos de imediato aqueles críticos cheios de intrigante vazio e de insight (o que também é um olhar, afinal).
Olifante: um tipo de berrante incrustado de jóias usado por Roland, na Chanson de Roland, para chamar as tropas do tio de volta, quando foi pego numa cilada em Roncevaux.
Onan: filho de Judá que, além de ter de se casar com a viúva do irmão e de ser morto depois por um ofendido Deus, ainda teria seu nome associado à prática de sexo solitário.
Onêiros: nome grego de Sonho, irmão de Morte.
Onisciência: o onisciente ([lt]. omnis "tudo" + scio "sei") é o que sabe tudo. Mesmo assim inventou-se a "onisciência parcial", algo que, confesso, me escapa.
Ordem: humanamente muito ciosos disso, perdemos o bom-senso que via ordem no caos. "Ordem" é um negócio militar: você põe as pessoas em fila e desce a porrada se saírem dela. Metaforicamente falando.
Ósculo: "beijo" é uma palavra carregada de conotações perigosamente libidinosas; daí que em certas circunstâncias utiliza-se o protocolar e tedioso "ósculo" no lugar dela, por um tipo de assepsia moral.
Osmose: é por causa desse fenômeno que algumas pessoas sequer precisam ler livros: basta carregá-los debaixo do braço.
Ouro: chamado "o vil metal", porque é evidente que a vilania não é coisa própria dos homens, mas de coisas inanimadas, como, nesse caso, o ouro.
Outeiro: um monte poético, vejam só: "À sombra de um outeiro".
Outro, o: no jargão da crítica de arte já misturado a seu tanto de psicanálise de boteco, o outro é uma entidade ectoplásmica que guardamos dentro de nós mesmos. Então, quando lemos um romance, uma novela, um conto, e descobrimos o "outro" de um personagem, é porque somos leitores muito perspicazes, já meio profissionais, e não esse outro, o naïve; fica muito bem em título de tese, por exemplo: "A questão do outro em William Wilson, de Edgar Allan Poe".
dezembro, 2005
chamaeleonte@yahoo.com.br