como
o raio
abre
rios no céu
lavras
um campo avaro
o
papel
com
tua escrita
colheita
de relâmpagos
OS
MORTOS
Doem,
os falhos enigmas,
Não
no vago corpo deles,
Doem
em nós, alguns leitores,
Os
esquecidos da língua
Onde
se guardam escritos.
Deveremos
aprendê-la
— alfabeto e reconquista
—
para
soletrar iguais
dimensões
de solidão?
a
fruta na mesa cansa os olhos até apodrecer
tira
a fruta
a
mesa cansa os olhos
tira
a mesa
a
cadeira
a
casa
fecha
a janela
muda
a paisagem
mas
tudo cansa
tira
os
olhos
(Em Objeto Útil)
Amianto,
o céu de Ulân Bátor
dobra-se
e redobra desertos
ao
rasgo de olho basilisco:
dentro
dele navegam fomes
de
vazio, de nada, mas tudo
foge
e o vazio é mais depois.
Exposta
fica a flor na mesa
à
espera da tempesta nula.
O
vento, sem vela não move
alguns
barcos que a sala ancora.
SAGHI NEHOR
Não
estamos em nenhuma Dízengoff,
rua
feita de vitrines e portos
cheios
de medusas tortas, feras
em
descanso pelos becos, vagas.
Nenhuma
catraia se aproxima
de
ilha nenhuma, de nenhum morto.
A
sombra de quem se espalha sombra
sabe
na pele sem espessura
o
cheiro cor de amarelo-prata.
e
é só esse cheiro lunar que fica,
defeso
ao toque, gesto entretanto
por
onde conjugado, em lugar
todo
posto em luz, cego porém
o
alfabeto das patas fendidas
hipótese
sempre de passagens
nos
azuis deste hálito apagadas.
Paisagem
resto, rastro do olhar,
modo
próprio de dizer maçã.
(Em Figuras na
Sala)
Em
que difere
bicho
o jaguar
de
um brilho, lapso
onde
ele espera
ponto
o final
de
novo o salto
para
engenhar
nesse
impossível
dele
a presença.
A
pedra comporia
o
do lápis-lazúli,
azul
e ouro, ou kitsch
escândalo
compacto.
O
diamante é gato,
unhas
as violetas
enviesam
o espaço
na
retorta da luz.
Porém
aqueleamém
todo
por si Che move
não
se expande se fecha,
todo
em copa de
cores.
A
mão se estende na mesa.
Vale
o céu peso de mesa
com
todas ferramentas?
Que
o céu pasto para nuvens
carregadas
de elefantas,
de
hipos, até mesmo símios
sombra
ao sol se reprepsentam.
Ignorar
o zôo das nuvens,
um
bom ângulo de ler.
(Em O Olho do
Canário)
La
descripción de la noche
Empieza
con los rumores
De
una tarde o de colores
grises,
amarillos, verdes
dentro
el verde, las violetas
entre
ráfagas, los blancos.
Lluvia
hacedora, timbre,
tinieblas,
cristal
corriente.
Son
hechos de arena:
flexibilidad,
mano
y corazón.
El
pájaro luna
En
azul presente.
(Em Colores
Siguientes)
RAIN
FOREST
1
O
relâmpago mostra
esta
eletricidade,
uma
flor em ação.
Observa-la
em nenhum
vaso,
fotografia
de
rosto que mirasse
a
si próprio, mas vendo,
aspecto
sob aspectos,
nele
a vaga presença.
2
O
conversar das folhas
sobre
minúcias amplas.
O
tumulto em detalhes
a
este dia acrescenta
um
sempre mesmo dia
guardado
em lua inédita.
A
eloqüência das folhas
dispersas,
os seus vôos,
inauguram
os pássaros
da
raiz
sabedores.
(Em Contar a Romã)
Poemas
de Óbvio
(imagens ©ana maria mascarenhas / back ©luisa
cortesão)
Moacir Amâncio começou publicando contos e novelas experimentais
para depois entrar na poesia, após um intervalo de quase 15 anos sem
lançar nenhum livro. Sempre foi jornalista, mas recentemente tornou-se
professor de Letras na Universidade de São Paulo. Seus livros de poemas
são: Do Objeto Útil (São Paulo: Iluminuras, 1993),
Figuras na Sala (São Paulo: Iluminuras, 1995), O
Olho do Canário (São Paulo: Musa Editora, 1998), Colores
Siguientes (São Paulo: Musa Editora, 1999), Contar
a Romã (São Paulo: Globo, 2001) e Óbvio
(São Paulo: Travessa dos Editores, 2004). Também publicou Os
Bons Samaritanos e Outros Filhos de Israel, reportagens e
crônicas (São Paulo: Musa Editora, 1997), Dois Palhaços e
Uma Alcachofra, ensaio (São Paulo: Nankin Editorial, 2001). Sobre Óbvio, aqui.
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