Notas
 
 
 

1  Vasari, Giorgio. Le vite dei più eccellenti pittori, scultori e architetti, Roma, Newton & Compton Editori, 1991. Este é o que dizem ser os primórdios da crítica de arte. Na maior parte das vezes, me parece que ela deveria ter se mantido nos seus primórdios.

 

2 Mesmo porque há quem diga, não sem alguma razão, que os métodos da Máfia surgiram por volta desse período nas práticas violentas de poder das famílias dos principados, dos ducados. Basta ler sobre a conspiração dos Pazzi apunhalando os Medici numa catedral, na História de Florença, de Maquiavel. Não é por coincidência que Mario Puzo escreveu The Godfather e The Borgia, contando respectivamente a história da família de origem siciliana de mafiosos estadunidenses e a da família que gerou rainhas, papas e verdadeiras chacinas do tipo "ajuste de contas", além de antológicas orgias na Itália da Renascença; lembrar também que havia escravagismo na época.

 

3 Já era um testemunho de memória, digamos, porque o duque era então Guid’Ubaldo, filho de Federico.

 

4 Não é uma arte que se perdeu de todo, a da iluminação de manuscritos. Soube de uns padres em Veneza que continuam a tradição. Aliás, como poderia ser em outro lugar que não Veneza, que se celebrizou por suas belíssimas edições (até mesmo na época da prensa, com o grande Aldus Manutius, que imprimiu, por exemplo, o Hypnerotomachia Poliphili, de Francesco Colonna)? Naqueles livros mencionados, trabalharam iluminadores como o florentino Francesco d’Antonio del Chierico, que iluminou as Disputationes Camaldulenses, de Landino.

 

5 Como escreve Giordana Mariana Canova em "The Italian Renaissance Miniature", in: Alexander, Jonathan JG. The Painted Page: Italian Renaissance Book Illumination (1450-1550), London/Munich, The Royal Academy of Arts and Prestel-Verlag, 1994, p. 21.

 

6 E que traduziu divulgou também com entusiasmo o Corpus Hermeticum de Hermes Trimegisto. Ver "O Pimandro de Ficino e o Asclépio", in: Yates, Frances. Giordano Bruno e a tradição hermética, São Paulo, Cultrix, 1990, pp. 32-57.

 

7 "Exhortatio ad amorem, de Marsilio Ficino", tradução de Ana Thereza Vieira, in: Resvista de tradução Modelo 19, n. 10, Unesp/Cacel, Araraquara, 2000, p.43.

 

8 Seria retomado pelos chamados neoplatônicos, como por exemplo o já mencionado Plotino, por Proclo, Firmicus Maternus (que escreveu livros sobre astronomia e sobre os mistérios de Elêusis e Ísis),  etc.

 

9 Dizendo assim parece simples, mas há de fato muita controvérsia respeitável entre os eruditos sobre como transpor essa pequena e onerosa palavra. William Ralph Inge, em suas ótimas palestras sobre a filosofia de Plotino (colecionadas nos livros The Philosophy of Plotinus, vol. I-II, London, Longmans, 1948), diz, no segundo volume: "Já notamos a peculiar dificuldade de encontrar equivalentes para os termos mais importantes na filosofia de Plotino. Foi uma grande infelicidade não encontrarmos nenhuma palavra senão "Matéria" para hulé, que é sobretudo imaterial. Para logos não há uma palavra única em inglês. É bastante diferente do Logos da teologia cristã, que os platonistas cristãos investiram de atributos do plotiniano Noûs (...), e é ainda mais difícil encontrar um equivalente satisfatório para Noûs." Páginas 37 et passim.

E ele escreve que considera a tradução por "intelecto" equívoca, e levará um capítulo inteiro até definir que prefere "espírito", etc. Mas eu creio que espírito seja igualmente equívoco, pelo uso que se faz a torto e direito da palavra, inclusive e principalmente aplicado ao caso religioso específico. No fundo, arcamos com a tarefa ingrata de selecionar termos filosóficos sempre que nos decidimos por um e não por outro. Fico com intelecto pelo sentido que a palavra encontrou, e de que ainda goza nos meios letrados, entre os stilnuovistas italianos, e que é mais ou menos o que descrevi acima, e podemos encontrar nos poemas de todos aqueles poetas, como Dante, que escreveu "Donne ch’avete intelletto d’amore", e assim por diante. Não é o Noûs, evidentemente, mas prepara uma possibilidade de uso, a meu ver, mais interessante.

 

10 Como o impecável e. e. cummings, que escreveu a "Ballad of an Intellectual". Ela começa: "Listen,you morons great and small/to the tale of an intellectuall". Uma sátira no estilo daquela de Maiakóvski ao crítico.

 

11 Notar que a quantidade de tempo que separa o pioneirismo dissecador de da Vinci da obra de esplêndido detalhe e especialização nas ilustrações, do médico Andreas Vesalius (De Humanis Corporis Fabrica), é de apenas vinte anos.

 

12 "Os Antigos, levando em consideração a construção rigorosa do corpo humano, elaboraram todas as suas obras, e especialmente seus templos sagrados, de acordo com essas proporções; pois eles encontraram aí as duas principais figuras sem as quais nenhum projeto é possível: a perfeição do círculo — o princípio de todos os corpos regulares — e o quadrado equilátero". Pacioli provavelmente pensava também no Homem de Vitrúvio, de Cesare Cesariano (que o fez considerando as idéias de Vitrúvio no De Architetura), que Da Vinci aperfeiçoou imensamente no famoso desenho para o Divina Proportione.

 

13 Remeto os leitores às conversas gentilíssimas de O Cortesão, de Baldassare Castiglione.

 

14 Medici, Lorenzo dei. "Comento sopra alcuni de’ suoi sonetti", in: Opere (a cura de Attilio Simoni), Bari, Giuseppe Laterza & Figli, 1939, pp. 22-23.

 

15 Burckhardt, Jacob. A cultura do Renascimento na Itália: um ensaio (Tradução de Sérgio Tellaroli e introdução de Peter Burke), São Paulo, Companhia das Letras, 1991, p. 228.

 

16 Poliziano, Angelo. Le Stanze, L’Orfeo e Le Rime (Introduzione e Notte di Attilio Momigliano), Torino, Unione Tipografico-Editrice Torinese, 1925. p.79. A partir deste trecho desenvolvi o poema "Por Angelo Poliziano", que publiquei em Descort (São Paulo, Hedra, 2003, p.63). Começa assim, para uma comparação:

 

Carregado num carro de heras e pâmpanos

            chega Baco, puxado por quatro cavalos pretos,

            com brilhos nos músculos, pêlos de cetim,

            tigres deitados ao lado, parreiras adornam o leito,

            gavinhas torcidas nos chifres recurvos,

            ninfas e um tirso erguido bem alto

            ao som de seus gritos;

 

17 Boiardo, Matteo Maria. Il Canzoniere: Amorum Libri (Introduzione e note di Carlo Steiner), Torino, Unione Tipografico-Editrice Torinese, 1925, p.8

 

18 Agradecimentos a Elen de Medeiros, que me passou uma porção de textos italianos.

 

19 A quem quiser ler o poema sugiro começar o esforço pela tradução de um trecho feita por Bocage; se ainda se sentir animado, poderá ir ao original.

 

20 E isso lhe valeu ser quase ignorado por Bertrand Russell (notório estudioso de Leibniz) na sua History of Western Philosophy.

 

21 Um aristotelismo, enfim: unidade de ação e tempo, separação clara entre gêneros, como a tragédia e a comédia. A famosa cena dos coveiros em Hamlet é sempre um emblema citado para exemplificar a mistura, coisa de gente bárbara como Shakespeare.

 

22 Voltaire (François-Marie Arouet). Cartas Inglesas (Tradução, Marilena de Souza Chauí Berlinck), in: Os Pensadores, vol. XXIII, Editora Abril Cultural, São Paulo, 1973, p.40.

 

23 Idem, p.41.

 

24 Orazio. "Ars Poetica", in: Tutte le Opere (A cura di Mario Scaffidi Abbate; Traduzioni di Renato Ghiotto e Mario Scaffidi Abbate; testo latino a fronte), Newton Compton Editori, Roma, 1992, p.474.

 

25 Aliás, Rochester era um espírito bastante afim ao nosso caro Voltaire: libertino, com espantosa facilidade poética e um dom para escrever numa língua inglesa que até hoje soa desimpedida, clara e fluente. Senão, dêem uma olhada nos seguintes versos:

 

Were I (who to my cost already am

One of those strange prodigious Creatures Man)

A Spirit free to choose for my own share,

What Case of Flesh and Blood, I pleas’d to weare,

I’d be a Dog, a Monkey, or a Bear,

Or any thing but that vain Animal,

Who is so proud of being rational.

The senses are too gross, and he’ll contrive

A sixth, to contradict the other Five;

And before certain instinct, will preferr

Reason, which Fifty times for one does err.

 

 (The Penguin Book of Restoration Verse, p. 22, From "A Satyr Against Man")

 

E não apenas: como se percebe, usa sua inteligência implacável para a sátira. É difícil achar poeta tão bom na mesma época — excetuando Andrew Marvell, que escrevia outro tipo de coisa, e foi chamado "metafísico" —, já que Waller funciona mesmo como texto musical (não estou, é claro, menosprezando o ótimo Waller).

 

26 Idem, nota 5, p.45.

 

27 Voltaire. Correspondance, vol. I (1704-1738), Texte établi et annoté par Theodore Besterman, Paris, Gallimard, "Bibliothèque de la Pléiade", 1964, pp. 456 e 461. 

 

28 O que também poderia ficar, numa versão burlesca que acaba de me ocorrer: "Um padre, um sim, o latinório,/ Resolvem o vosso casório".

 

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